quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Crítica: Foxcatcher (2014)

"Coach is the father. Coach is a mentor. Coach has great power on athlete's life." 
John du Pont
*8/10*

Bennett Miller sabe realizar um bom filme onde o desporto é rei e, depois do razoável Moneyball – Jogada de Risco, supera-se em Foxcatcher, levando o seu trabalho a um patamar onde uma tensão perturbadora assola a plateia do início ao fim. Mais do que filmar o desporto, Miller filma um drama inspirado em acontecimentos verídicos que nos mantém presos ao ecrã, num ambiente sombrio e suspeito.

Para além de nos dar a conhecer a luta livre, o realizador introduz-nos num thriller psicológico difícil de digerir, envolto numa realização e fotografia de excelência, e com desempenhos aterradores por parte dos três actores principais: Steve Carell, Channing Tatum Mark Ruffalo (muito provavelmente, nos seus melhores papéis de sempre).

Foxcatcher conta a história de Mark Schultz (Channing Tatum), lutador olímpico de luta livre premiado com uma medalha de ouro, que vive em Wisconsin com dificuldades desportivas e económicas. Certo dia, é convidado pelo milionário John du Pont (Steve Carell) para se mudar para a sua luxuosa propriedade, onde este planeia formar e treinar uma equipa de luta livre para os Jogos Olímpicos de Seul de 1988. Schultz aproveita a oportunidade, ansioso também por sair da sombra de Dave (Mark Ruffalo), o seu irmão mais velho, um respeitado treinador de luta livre, também ele medalhista olímpico.


O argumento de Foxcatcher não nos dá explicações, temos apenas imagens, palavras, acções e um ambiente muito especial, onde a tragédia parece pairar, mesmo que desconheçamos o caminho que a história irá tomar (se não conhecem os acontecimentos que dão origem a Foxcatcher, investiguem apenas depois). E é a dimensão psicológica que faz do filme um dos grandes do ano, com esta névoa a assombrar-nos, como algo que se esconde por detrás das personagens e, sem sabermos bem como, nos perturba e angustia - uma espécie de pressentimento, talvez.

Para adensar todas estas sensações incómodas, o elenco faz um trabalho extraordinário. Steve Carell dá uma lição de representação a todos os que apenas o viam como um cómico: transfigurado - onde até a voz não parece a mesma -, o actor encarna du Pont com uma postura fria, frágil e, ao mesmo tempo, pouco confiável. Vamos ter pena dele mas igualmente receá-lo, no meio dos seus desequilíbrios e atitudes estranhas. Por sua vez, Channing Tatum mostra o actor que há em si como Mark Schultz e, apesar de fisicamente ser tão fácil imaginá-lo num filme de desporto, a carga trágica que carrega consigo é digna de elogios. Tatum oferece-nos uma interpretação sofrida, revoltada e, por vezes, furiosa (a cena no quarto de hotel é um bom exemplo). A acompanhar, temos Ruffalo como Dave Schultz, um homem ponderado e fiel aos seus valores, que adora o irmão e põe a família à frente de tudo. O actor tem uma interpretação tranquila e consistente, capaz de conquistar a simpatia da plateia.


Tecnicamente, a tensão aumenta com a predominância de planos fixos, com um excelente trabalho da direcção de fotografia de Greig Fraser, que tanto contribui para o carácter sombrio de Foxcatcher. Ali, não nos sentimos seguros, nem temos para onde fugir. O realizador controla-nos da mesma forma que du Pont parece controlar os irmãos Schultz e intimida-nos como a personagem de Steve Carell se sente intimidada pela presença da mãe. A banda sonora contribui da mesma forma para o desconforto que a longa-metragem de Miller nos transmite e torna tudo ainda mais especial, tenebroso e sombrio.

O ambiente pesado sente-se por todos os recantos da tela, as personagens não nos transmitem segurança e o desequilíbrio psicológico de du Pont perturba-nos. No fim e entre os receios da plateia, Foxcatcher traduz-se num retrato sóbrio e arrepiante de uma tragédia que assolou o desporto.

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