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quarta-feira, 24 de abril de 2024

Crítica: Guerra Civil / Civil War (2024)

"I need a quote."
Joel


*8/10*

Eis que chega aos cinemas um blockbuster sobre jornalismo de guerra. Alex Garland não se faz rogado e arrisca numa Guerra Civil fictícia, mas cheia de semelhanças com a realidade, onde o papel dos jornalistas é ponto fulcral da existência e sucesso da longa-metragem.

Talvez num convite à reflexão - feito, aliás, durante toda a longa-metragem -, nos EUA, simbolicamente, o filme estreou a 12 de Abril, o mesmo dia em que, em 1861, teve início a Guerra Civil Americana. 

O realizador não se compromete com tomadas de posição (quem serão os bons ou os maus, ou se há um tom premonitório que torne esta Guerra Civil cinematográfica numa possibilidade real), cumprindo, contudo, a função de relatar os acontecimentos (fictícios, neste caso), com rigor e isenção, promovendo o pensamento crítico da sua audiência. Não terá aqui um papel muito semelhante ao dos jornalistas protagonistas?


"Num futuro próximo, a América está dividida em múltiplas facções que se envolveram numa guerra civil em rápida escalada. As Forças Ocidentais, uma aliança armada de estados em revolta contra o governo federal, está a dias de forçar a rendição do Capitólio. Na esperança de conseguir uma derradeira entrevista com o presidente, uma fotógrafa que captou atrocidades e conflitos em todo o mundo, viaja numa pequena caravana de jornalistas que tenta alcançar Washington antes que os rebeldes se apoderem da Casa Branca."

Alex Garland segue quatro jornalistas numa espécie de road movie por cenários de guerra, numa longa e perigosa viagem por território americano em estado de sítio. Entre locais destruídos, abandonados, corpos no chão - ou em valas - e tiroteios, passando por campos de refugiados, exércitos e rebeldes ou por facções que dominam determinados territórios, agora sem lei, o caminho é sinuoso e muito arriscado, e nem o colete identificativo de "press" ("imprensa") dá mais segurança ao grupo de repórteres. Tudo parece atrasar a jornada de obstáculos para chegar a Washington e ao ainda Presidente dos EUA. A Alex Garland não interessa especialmente revelar o exacto motivo que desencadeou esta Guerra Civil. Ele quer sim, que os jornalistas cheguem a bom porto e consigam alcançar o furo jornalístico que tanto ambicionam e pelo qual tudo farão.


Neste thriller, com excelentes sequências de acção, onde se vêem destruídos alguns marcos arquitetónicos norte-americanos, o realizador coloca a câmara (e a plateia) ao lado dos jornalistas, proporcionando momentos verdadeiramente incómodos e impressionantes.

Na era do imediatismo e das notícias falsas, Guerra Civil destaca a importância da presença dos jornalistas - e da paixão que as quatro personagens têm pela profissão, seja o veterano Sammy, que apesar da idade avançada, não admite a ideia de não se juntar à viagem, ou a jovem fotógrafa Jessie, que embarca junto da sua referência no fotojornalismo de guerra, Lee. Ela e o seu colega Joel, apesar da experiência em cenários de guerra, não parecem também estar preparados para a violência que esta jornada até ao Presidente lhes guarda. A vocação e a coragem para cumprir o seu dever de informar - a que se junta, claro, a adrenalina de ser o primeiro a dar a notícia - são fundamentais para contar a "estória" com isenção, rigor e objectividade. 


Kirsten Dunst, Wagner Moura, Cailee Spaeny e Stephen McKinley Henderson formam o heterogéneo grupo de jornalistas a enfrentar o sinuoso caminho rumo a Washington, e os quatro actores são capazes de trazer a humanidade necessária a cada personagem, entre o tormento, a adrenalina, a curiosidade e a resiliência. Destaque ainda para os breves momentos de Jesse Plemons no ecrã, num dos momentos mais tensos e inesperados da acção.

Com Guerra Civil, Alex Garland redime-se da péssima abordagem do seu filme anterior (Men, 2022) e regressa ao percurso, iniciado com Ex-Machina, em 2014, de dotar os géneros aparentemente "gastos" de uma originalidade incomum, com coragem e engenho.

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