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terça-feira, 31 de julho de 2018

Sugestão da Semana #335

Das estreias da passada Quinta-feira, a Sugestão da Semana destaca o mais recente filme de Michael Haneke, Happy End, com Isabelle Huppert, Jean-Louis Trintignant e Mathieu Kassovitz.

HAPPY END


Ficha Técnica:
Título Original: Happy End
Realizador: Michael Haneke
Actores: Isabelle Huppert, Mathieu Kassovitz, Jean-Louis Trintignant, Fantine Harduin, Franz Rogowski, Toby Jones, Laura Verlinden
Género: Drama
Classificação: M/12
Duração: 107 minutos

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

#MeToo... but not this way

Sou mulher e, como a maioria (senão a totalidade) do sexo feminino, tenho várias razões para me juntar ao movimento #MeToo. Ainda assim, não pretendo defendê-lo nas proporções que tem tomado, onde se julgam pessoas em praça pública e a presunção de inocência a que todos têm direito é totalmente esquecida.


Todos se lembram onde o movimento começou: Harvey Weinstein. Após muitas décadas de opressão, as mulheres colocaram o medo de lado e denunciaram abusos por parte do produtor cinematográfico. Os nomes mais sonantes envolvidos são os de Rose McGowan, Ashley Judd, Jessica Barth, Angelina Jolie, Gwyneth Paltrow, Cara Delevingne ou Lea Seydoux.

Depois do tiro de partida, muitas mais acusações surgiram: Brett Ratner, Bill Cosby, John Lasseter, Dustin Hoffman, James Toback, Kevin Spacey... Com Spacey o caso tomou proporções especialmente marcantes. O actor foi afastado de House of Cards e substituído, a poucas semanas da estreia, por Christopher Plummer em Todo o Dinheiro do Mundo. E começa aqui a questão: onde fica a linha que separa o pessoal do profissional? Kevin Spacey é um dos melhores actores da sua geração e não são acusações de assédio que podem apagar esse facto. Alfred Hitchcock assediava a maior parte das suas actrizes e continua a ser o mestre do suspense...


No evoluir das polémicas e com o surgimento do #MeToo e do #TimesUp, Dylan Farrow lembrou-se que seria excelente altura para voltar a acusar Woody Allen de abuso sexual. O cineasta foi investigado na época das acusações nos anos 90 e nada ficou provado, sendo o mais provável que tudo não passasse de uma invenção de Dylan, na época com sete anos, potenciada pela pressão de Mia Farrow. De tempos a tempos, esta história volta à ribalta, com Dylan, agora com 32 anos, a acreditar verdadeiramente no que diz. Todavia, de repente, a cobardia tomou conta de Hollywood e mesmo quem já foi investigado e tido como inocente passa a ser julgado e condenado, sem provas, pelos seus pares e opinião pública - que, como sempre, tem dois pesos e duas medidas. E já nem falemos do caso Polanski e dos seus apoiantes (Mia Farrow, por exemplo...) e oponentes, num contexto completamente diferente de Woody Allen.

Woody Allen é mesmo o caso mais dramático, com actores com quem trabalhou a distanciarem-se do cineasta: Rebecca Hall, Timothée Chalamet, Colin Firth, Mira Sorvino (ganhou um Oscar à conta dele), Greta Gerwig, Natalie Portman (que tem tido outras saídas infelizes), Rachel BrosnahanDavid KrumholtzEllen Page. Todos trabalharam com ele depois das acusações e das investigações, todos se lembraram agora que era excelente ideia virar-lhe costas e insinuar a sua culpa, mais de 20 anos depois dos investigadores o terem ilibado. Para juntar a tudo isto, o próximo filme de Woody Allen, A Rainy Day in New York, pode estar em risco de ter estreia comercial. Está tudo louco!


Não quero deixar de ver os meus cineastas favoritos nos cinemas por acusações que já foram investigadas há mais de duas décadas e onde não existiu crime. Um grupo de feministas queria que retirassem uma estátua de Allen de Oviedo. Santa ignorância! Tragam-ma aqui para casa, já que não a querem. Tantos direitos pelos quais lutamos e agora este medo desmedido faz-nos negá-los aos nossos semelhantes? Chega a ser tudo ridículo. Ver Woody Allen, o realizador que tantos elogios à mulher tem feito nos seus filmes, que constrói personagens femininas fortes e inesquecíveis, ser mal tratado desta forma por Hollywood e não só, é revoltante!

Voltando ao assédio propriamente dito. É sabido que é o Poder que coloca o agressor em vantagem em relação à vítima, e certo é também que a maioria dos primeiros são homens e das segundas mulheres. É verdade também que esta "revolução" tem feito muito pelas mulheres que perderam o medo e finalmente se sentem seguras para denunciar os seus agressores. Mas o aproveitamento mediático que se está a fazer da situação não pode continuar. Seja pelas demonstrações de apoio que nada acrescentam (todos vestidos de preto, para quê?), seja pela multiplicidade de acusações que se sucederam em tom de aproveitamento, sem provas ou com casos muito mal explicados, e a consequente ruína da carreira dos acusados. Olhemos para James Franco e para o momento em que surgiram as acusações contra si: logo depois de vencer o Globo de Ouro de Melhor Actor de Comédia. Tudo o que se seguiu foi o afastamento do actor na corrida aos prémios com a sua melhor interpretação de sempre. De repente, já ninguém lhe reconhece talento nem ao seu filme Um Desastre de Artista. É justo? Para mim, não é.


Feminismo não é acusar qualquer homem que respire ou qualquer mulher que goste de se vestir como quer. Mais recentemente, Jennifer Lawrence foi criticada pelo vestido que usou em fotos com os actores de Agente Vermelha (Red Sparrow) por ser bastante revelador e estar muito frio. A batalha que tem levado a cabo no que respeita a igualdade salarial em Hollywood não parece ter servido de muito aos puritanos (ou invejosos?) que preferem criticar as escolhas e gosto de uma mulher adulta e independente. Já não se pode ser mulher.

Também já ninguém pode abrir a boca se tiver uma opinião ligeiramente diferente da maioria, a liberdade de expressão é só para alguns, no que toca a estes temas. Matt Damon e Quentin Tarantino são os casos mais flagrantes de quem não mediu as palavras e foi mal interpretado e, ainda que os ânimos estejam menos agitados, Tarantino já parecia começar a ter problemas com o próximo filme. Eu quero continuar a ver o mestre Tarantino no cinema!

Na Europa, Catherine Deneuve e Brigitte Bardot vieram manifestar o seu ponto de vista (bastante menos radical e mais da velha guarda) e foram imediatamente abalroadas por movimentos feministas. Michael Haneke ainda deve ser dos poucos cuja opinião não é tão contestada. Falou, e bem, sobre o que se passa actualmente e só lhe posso dar razão. Critica o "total rancor sem qualquer reflexão e uma raiva cega, não baseada em factos, mas que destrói as vidas de pessoas cujos crimes não foram provados". É isto que tenho vindo a defender em conversas acesas com amigos ou conhecidos, desde Outubro passado.

Estou farta de lutos hipócritas, de manifestações pouco solidárias, de julgamentos em praça pública, de quererem eliminar da História do Cinema e da Televisão nomes que tanto têm feito pelas suas artes. Sou feminista, concordo que o assédio tem de ser punido e que a igualdade entre sexos deveria ser um direito adquirido.

Não podemos deixar que banalizem um assunto tão sério. E é isso que está a acontecer. Há que lutar por justiça, para as vítimas e para os que estão a ser acusados injustamente. Há que clamar por bom senso e não deixar que a História do Cinema (ou Televisão, ou Teatro) seja destruída em actos de raiva e cobardia.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

O Filme da Minha Vida, por Tiago Brito

Por Tiago Brito


Creio que terei uns problemas a resolver nesta crónica: não sei qual o filme da minha curta vida. Não sei qual levaria para a famosa ilha deserta e muito menos sei se daqui a uns anos continuarei a gostar dos filmes da minha vida.

Mas alguma coisa sei. Sei que são muitos os filmes que me marcaram e uns quantos que mudaram a minha vida, para o bem e para o mal. Categorizo-os por alturas especificas da minha vida nas quais tiveram uma importância crassa na minha forma de pensar o mundo ou até de vivê-lo.

Talvez terei encontrado um caminho por onde seguir no paragrafo anterior. Posso escolher um filme que num passado próximo me tenha deixado abismado. Sim, abismado. Esse filme é Amour do Michael Haneke. Desta forma direi o que penso neste exacto momento e serei fiel ao meu eu, nesta altura da vida.

Não gosto de ver trailers e muito menos os que mostram o filme quase todo. Tira-me a vontade de ver os filmes e por isso falha o seu propósito. O que me incentiva a ir ver um filme é o cartaz que me chama a atenção, a imagem que fica, o titulo que não me sai da cabeça ou o comentário depreciativo de alguém que não tem o mesmo gosto que eu. Com os grandes realizadores não precisamos de incentivo. É apenas esperar que estreie o próximo filme.

Em Amour caí de paraquedas. Não quis saber de nada, muito menos ler as críticas. Tentei, como uma toupeira, cavar um túnel até à sala de cinema (afinal não terei caído de paraquedas mas cavado um túnel). E ali cheguei eu, a meio de uma estória, não a meio do filme. Sim, esse poder de sonho que o cinema tem de nos intrometer a meio da acção sem darmos conta, até acordarmos no fim e começarmos a reflectir sobre o que acabámos de viver. Tal como um sonho.

Entrei devagar e delicadamente na vida daquele casal. Não sabia quem eram, nem de onde vinham mas no meio de tantas possibilidades de personagens, Haneke escolheu as mais indicadas para falar sobre o amor. Haneke resolve quaisquer dúvidas, no início do filme, sobre o que irá acontecer no final e mostra-nos que o importante não é reviravoltas inesperadas mas o que acontece passo a passo, tal como no amor. Não é o viveram felizes para sempre mas o que acontece a cada dia que passa e por isso o filme é continuo, focado num espaço de relativamente um ano e não uma vida inteira. 

O seu sentido de Tempo é inquebrável e justo. A distância a que estamos dos personagens, exacta, sem invadir privacidades de alguém que ainda há pouco conhecemos. Não se poupa a pormenores e a subtilezas de uma família contemporânea. Retira desde o início o factor social de - coitadinhos dos velhinhos que não têm dinheiro para poder viver um final de vida em condições. Este casal tem dinheiro e por isso centra o filme não num drama social mas num drama, única e exclusivamente. Dá espaço a que só se fale de amor. Poucos realizadores poderiam chamar Amor a um filme seu, seria demasiado arriscado falhar a premissa a que o titulo remete mas Haneke é um dos que pode.


Não pretendo fazer um apanhado do filme nem é esse o desígnio da crónica. Talvez o comentário, que ouvi ao sair da sala de cinema, o resuma bem: “Paguei eu dinheiro para ver uma velha morrer aos poucos e poucos...”.  Faltou só o pequeno grande reparo, que o seu marido a acompanha na degradação, alimenta-a, trata-a com as suas próprias mãos em vez de a lançar num lar aos cuidados de quem calhar, aceita as opções da sua mulher, enfrenta a vergonha alheia de uma pessoa que vai perdendo as capacidades e autonomia aos poucos, não vive preso a recordações, embora as estime. Enfrenta a sua filha mimada e que nem uma vez se oiça um queixume seu. Não é fictício e por isso humano, tem momentos negros e acções imponderadas. 

É um filme verdadeiro na falsidade e uma estória de amor com um final trágico. O final é um ponto crucial no filme e no qual a acção em que personagem principal incorre é algo que eu não concordo como opção de morte. Sendo uma obra de arte, dá espaço a interpretação e não impõe um ponto de vista que não dê para ser interpretado pelo espectador, a meu ver. Teria muito mais para dissertar sobre o filme, e principalmente o fim, mas não cabe nesta crónica que, por descuido, já a alonguei mais do que devia. 

Este filme foi visto numa altura em que esta estória, numa dimensão familiar e não conjugal, fazia e ainda faz parte da minha vida. A opção de cuidar dos nossos, até ao fim das suas vidas, é Amor com A grande. Ainda mais quando alguém é responsável pela nossa existência ou quando, no caso do filme, foi cúmplice na nossa felicidade e abrigo na infelicidade. Não nos é obrigado que façamos, não é sequer o mínimo que podemos fazer e também sabemos que não receberemos nada em troca. Não é com um interesse num fim. Esse A grande é posto à prova no final da vida e é onde é mais preciso mas também, mais fácil de quebrar.

Afinal falo de um filme que não sei se é o da minha vida mas que tem parte dela. Parece-me um problema resolvido.

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Tiago Brito, no mundo da música, é o Capitão Tiago, guitarrista da banda Os Capitães da Areia. Ao mesmo tempo, desistiu do curso de engenharia para estudar realização, cujo curso completou em 2013. Tem actualmente a sua curta-metragem, Rio Turvo, a concurso em festivais de cinema e está a criar uma produtora. A actividade musical, claro, continua.

Agradeço ao Tiago ter aceite o meu desafio.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Sugestão da Semana #41

Numa semana onde duas estreias se destacam das restantes, a minha sugestão vai para o mais recente filme de Michael Haneke, que já tem crítica no Hoje Vi(vi) um Filme.

AMOR

Ficha Técnica:
Título Original: Amour
Realizadores: Michael Haneke
Actores: Jean-Louis Trintignant, Emmanuelle Riva e Isabelle Huppert 
Género: Drama, Romance
Classificação: M/12
Duração: 127 minutos

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Crítica: Amor / Amour (2012)

*9/10*

Tocante, perturbador, mas repleto de Amor, é assim a mais recente longa-metragem de Michael Haneke, que lhe valeu mais uma Palma de Ouro em Cannes. Aqui a máxima do “até que a morte vos separe” é cumprida, e já o sabemos desde os primeiros minutos. Compreendemos, desde logo, que Amor não é para ser visto de ânimo leve e irá mexer com o que há de mais intrínseco em cada um de nós.


Depois das crianças de O Laço Branco, é agora um casal de idosos que protagoniza mais um duro filme do realizador austríaco. Quem conhece Haneke sabe que ele não descansa enquanto não deixa o seu público inquieto. Amor vem, uma vez mais, provar isso mesmo, ao contar a história de Georges e Anne, dois octogenários, cultos, professores de música reformados. A filha, igualmente música, vive no estrangeiro com a família, e passa pouco tempo junto dos pais. Certo dia, Anne é vítima de um acidente e o amor que une este casal será posto à prova.

Michael Haneke vai directo ao assunto desde o primeiro minuto. Sabe-se que o final não é feliz, e é no fim que Amor começa. Mas mais importante do que o fim, é conhecer a relação, e é para isso que recuamos no tempo, para um concerto de música clássica onde os professores reformados estão. O dia a dia de Anne e Georges é-nos apresentado, até ao momento em que a doença de Anne se manifesta. A partir daí, as mudanças na vida e relação de ambos são o centro de tudo. O Amor que é posto à prova e que dá nome a este filme. Por sua vez, o final é um regresso ao início, brilhante e inquietante.

Um argumento que parece tão simples, revela-se muito mais complexo e exigente a cada cena, a cada plano, a cada expressão dos actores. São tantos os sentimentos que estão em jogo em Amor, e não só os das personagens, os nossos também. Qualquer pessoa se irá rever, de uma forma ou de outra, na história que é contada no grande ecrã. É a realidade ficcionada que ali está, e essa consegue ser muito perturbadora.

Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, ali está Georges, “até que a morte os separe”. As mudanças para as quais nunca estaremos preparados acontecem, e o casal protagonista também tem de aprender a lidar com elas. O estado de Anne, que se agrava ao longo do filme, demonstra bem como há lutas dolorosas e infrutíferas. Georges, por seu lado, demonstra uma força excepcional. É ele o símbolo máximo deste Amor, um amor maior do que a própria morte.

Há um vazio crescente e profundo que se sente e estende da casa, espaço onde se passa praticamente toda a acção, a Georges e, claro, a Anne, e que é intensificado pelos planos longos e estáticos de Haneke, tão necessários, que acompanham, lentamente, os nossos pensamentos e recordações ao assistir a Amor. Num filme onde a música que os personagens transpiram constrói todo o ambiente, a música clássica, claro, está presente até nos silêncios.


No elenco dois grandes nomes: Emmanuelle Riva e Jean-Louis Trintignant, com interpretações fabulosas. Riva merece todo o reconhecimento possível pela forma como encarnou Anne, de corpo e alma. Como, sem articular uma palavra, consegue transmitir tantas emoções e sentimentos. Sente-se, em cada cena onde surge, o desgaste físico e emocional que terá sido para a actriz vestir a pele desta personagem. Por seu lado, Trintignant é o motor que faz avançar a acção. O outro lado do sofrimento que ambos vivem, mas também a personificação do amor que sentem. Georges é outra personagem difícil e desgastante e Trintignant oferece-nos uma interpretação magistral.

Isabelle Huppert, com uma presença mais curta no filme é, antes de mais o fruto do amor dos protagonistas, Eva, a filha ausente mas que ama e se preocupa com os pais. A actriz francesa tem, como sempre, um bom desempenho. De destacar ainda, apesar dos poucos segundos em que surge no ecrã (apenas duas cenas), é uma presença portuguesa, Rita Blanco, que tem um pequeno papel como porteira.

Michael Haneke sabe como chegar ao nosso âmago. Amor é um retrato de uma vida a dois, de um amor capaz de salvar, que nos põe cara a cara com a dura realidade que fazemos por esquecer.