quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Crítica: O Senhor das Moscas / Lord of the Flies (1963)

"Kill the pig! Slit her throat! Bash her in!"

*9/10*

A inocência é perdida após poucos dias numa ilha deserta e os instintos mais selvagens transformam crianças em monstros. O Senhor das Moscas, de Peter Brook, é uma alegoria à anarquia que se instaura quando as regras desaparecem e a figura de liderança não existe. Um filme arrebatador e sem receios que mostra, através dos mais puros, como o mal pode tomar conta do homem.


Depois do avião em que viajavam se despenhar, um grupo de crianças britânicas vê-se isolado numa ilha deserta. O ambiente selvagem e paradisíaco, onde não existe a autoridade dos adultos, faz com que o grupo de divida e se transforme numa organização tribal violenta.

Peter Brook constrói um filme violento e brutal, num retrato cru de como o Homem dito civilizado depressa se pode transformar numa besta primitiva e sem valores, basta que deixe de haver autoridade legítima. Para este retrato, o realizador adapta ao cinema o livro homónimo de William Golding, que coloca as crianças como protagonistas desta história chocante. E se rapazes tão pequenos entram em tal escalada de violência e actos irracionais, não nos espantemos com as ditaduras que por todo o mundo ainda vingam nos tempos que correm. Querem filme mais intemporal?


O Senhor das Moscas é uma chamada de atenção para os perigos a que todos estão sujeitos. Mais incómodo tudo se torna com protagonistas tão jovens. Do inofensivo (?) bullying típico da idade - mas obviamente condenável -, ao confronto de opiniões que resulta numa votação democrática, para que aquela pequena comunidade possa funcionar com regras, depressa um grupo se insurge e quer mais poder, menos responsabilidades. Acima de tudo, o poder. A libertinagem confundida com liberdade.

Tantas serão as metáforas encontradas no filme de Peter Brook que vale a pena ver e retirar a lição devida desta longa-metragem. Para além da fenomenal história, os jovens actores merecem todo o mérito, com interpretações corajosas e a direcção de fotografia proporciona-nos momentos únicos a preto e branco, usando a luz com mestria, fazendo o fogo ganhar vida e brilho no meio da noite. A banda sonora remete-nos para as tribos e seus rituais, e aumenta a tensão que as imagens já de si transmitem.


O Senhor das Moscas leva-nos numa escalada de loucura à criação de uma sociedade violenta e anárquica liderada por crianças. O medo e a ânsia de poder dominam as motivações, crenças e valores do ser humano.

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