*8/10*
O 8 ½ Festa do Cinema Italiano já deixou Lisboa e rumou a Coimbra, mas há ainda que destacar um dos grandes momentos da passagem do festival pela capital: a exibição de Too Much Johnson, o filme perdido de Orson Welles.
O filme mudo, rodado em 1938 para servir como prólogo da peça teatral homónima exibida no Mercury Theatre de Nova Iorque pelo próprio autor, foi recentemente descoberto e posteriormente restaurado. Inacabado por problemas financeiros, Too Much Johnson foi encontrado por acaso em 2008 nuns armazéns em Pordenone, Itália. Pensava-se que o filme teria desaparecido no incêndio de 1970 no apartamento de Welles. Esta descoberta foi de enorme valor no que respeita à recuperação, salvaguarda e difusão do património cinematográfico.
O Cinemazero e a Cinemateca do Friuli - responsáveis pela descoberta e pelo restauro (juntamente com a George Eastman House e a National Film Preservation Foundation), respectivamente - foram premiados pela National Society of Film Critics.
O 8 ½ Festa do Cinema Italiano deu a oportunidade aos espectadores portugueses de assistir a este clássico inacabado (e incompleto) na Cinemateca Portuguesa, no dia 16 de Abril, e no Cinema São Jorge, no dia 17, onde o filme foi - e muito bem - acompanhado ao piano por Filipe Raposo.
Too Much Johnson, de William Gillette, é uma comédia teatral de 1894 que conta a história de um playboy nova-iorquino, que para fugir ao violento marido da sua amante, rouba a identidade do proprietário de uma plantação em Cuba, que entretanto espera a chegada da sua “esposa por correspondência”. É a partir desta sinopse que poderemos construir ligações entre os fragmentos que vemos no filme de Welles. Três anos antes da estreia de O Mundo a Seus Pés (Citizen Kane), Orson Welles aventurou-se nesta produção que, infelizmente, não ficou completa.
Too Much Johnson, por si só, funciona mais como uma curiosidade da História do Cinema, do que como um projecto uno e finito. Faz parte da construção de uma grande carreira, notamos influências clássicas mas verificamos também a imaginação e a singularidade da realização que, anos mais tarde, tomou forma plena em O Mundo a Seus Pés. Este registo work in progress apresenta-nos uma história de amores e desamores, de divertidas perseguições em telhados, quase labirínticas, de lutas de espadas e um guarda-chuva que não deixaram a plateia indiferente. Apesar de não existir um fio condutor que ligue as cenas soltas que vamos vendo, isso aqui não importa, pois sabemos de antemão que somos uns privilegiados em poder assistir a um marco histórico, que se julgava perdido.
A sessão musicada - onde o Hoje Vi(vi) um Filme marcou presença - resultou perfeitamente com as imagens projectadas e é de elogiar o rigoroso e esforçado trabalho que o pianista e compositor Filipe Raposo concretizou.
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