domingo, 18 de março de 2018

Crítica: Colo (2017)

*8/10*

A adolescência é, mais uma vez, o foco de Teresa Villaverde, que a explora tendo como ambiente a crise económica e os problemas de uma família. Mas tudo extrapola o mais comummente associado a estas temáticas. Não será talvez um filme fácil, mas é profundo, mágico, num bonito retrato da protagonista, Marta. Ela precisa de Colo, sem dúvida.

Em Lisboa, uma mãe trabalha em dois empregos enquanto o seu marido ficou desempregado. Têm uma filha adolescente. Com as dificuldades que se vão acumulando, gradualmente eles afastam-se uns dos outros, e uma tensão cresce em silencio e culpa.


Marta é o motor da narrativa de Colo, cujo drama, quase fantástico, acompanhamos pela câmara atenta de Teresa Villaverde, apaixonada pela adolescência desde o início da sua carreira. Ela espreita pela janela, percorre os corredores, segue personagens nas suas descobertas e aventuras. Adapta-se à personalidade e estado de espírito de cada um e compõe uma espécie de poema visual pouco comum no cinema português. E entre a aura pesada que paira sobre as personagens, ainda vamos conseguir rir com momentos inesperados, quase surreais.

Filha, pais, namorado e amiga. Todos fogem de si e dos problemas. A todos falta a coragem e resiliência de Marta. Ela tem inseguranças, receios, problemas que esconde, mas é, de todos, a que mais vontade tem de continuar a ser ela mesma. E quem esquecerá o seu inseparável pássaro? É com ele que se estabelece um curioso paralelismo. Ele é, de todas as personagens, o mais próximo da protagonista. É o único que precisa dela e o único que a acompanha. E têm muito mais que isso em comum. Ele simboliza o próprio crescimento de Marta e o evoluir do mundo à sua volta. Ele é o conforto e o confidente dela. Menina e pássaro têm uma relação muito sensorial também, compondo dos mais bonitos planos da longa-metragem.


Entre as indecisões e desorientação, chegamos ao topo do prédio de muitos andares onde a família de Marta vive, na parte oriental de Lisboa. Ali, somos colocados no terraço das amarguras, do desespero, onde a vista sobre a Lisboa moderna é estonteante.

A adolescência sonhadora e inocente, a vida adulta arrependida e cobarde. Todas as personagens se movem com ânsia de liberdade e esperança, mas de forma muito diferente. Marta é a heroína da história e Alice Albergaria Borges, a actriz que a interpreta, torna-a terna, decidida e cheia de personalidade.


Percebe-se porque é que a crítica internacional não gostou de Colo: tiveram medo. Medo que lhes aconteça a eles, medo de sentir culpa por terem despedaçado Portugal. Esse medo sobrepôs-se a tudo o resto e não foram capazes de alcançar a beleza e significância da obra de Villaverde. Ela adivinha um rejuvenescimento de coragem e esperança, mas sempre alerta.

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