"E o Senhor o feriu pela mão de uma mulher."
*8/10*
Vénus de Vison teve antestreia nacional no LEFFEST'13 e já está nos cinemas. Sozinho num teatro parisiense após um dia de audições a actrizes para a peça que está prestes a encenar, Thomas (Mathieu Amalric) lamenta ao telefone o fraco desempenho das candidatas. Ninguém tem a dimensão necessária para assumir o papel principal, e, quando se prepara para sair, eis que surge Vanda (Emmanuelle Seigner), um verdadeiro turbilhão de energia, tão desenfreada como atrevida. Vanda incorpora tudo o que Thomas odeia. Ela é vulgar, insensata, e fará de tudo para conseguir o papel.
Mais uma vez, teatro e cinema fundem-se na filmografia de Polanski, depois de O Deus da Carnificina. Desta vez, o palco está ali, e tudo acontece naquele espaço - um teatro parisiense. O cineasta adaptou a peça de David Ives que se debruça sobre o romance Venus in Furs, de Leopold von Sacher-Masoch. Às (apenas) duas personagens em cena - no ecrã de cinema e no palco do teatro -, soma-se um argumento provocador, que vem recuperar temas recorrentes em outros filmes de Roman Polanski, e o resultado é provocador e aberto às interpretações da plateia.
Vénus de Vison está repleto de jogos de poder e de sedução. Machismo - "E o Senhor o feriu pela mão de uma mulher", já Vanda se queixava - , feminismo, travestismo ou masoquismo, encontramos de tudo neste trabalho de Polanski. Mas Vanda parece sair sempre por cima, contrariando a reticência inicial de Thomas. Ela seduz, mas não se deixa seduzir, ela irrita-o, humilha-o, mas, acima de tudo, ela é tudo aquilo que ele imaginou.
O poder, tão central em Vénus de Vison, começa por ser detido por Thomas, o encenador saturado de procurar a sua Vanda. Ele nega-se a fazer a audição da atrasada actriz, com tão maus modos e -aparentemente - poucos conhecimentos dramáticos. Todavia, rapidamente é Vanda que passa a deter o poder, contestando, surpreendendo e dominando o seu avaliador. E mesmo quando os papéis se voltam a inverter, é ela que o subjuga, novamente.
E é na personagem feminina que reside o mistério que perdura até ao final. Quem é esta mulher, que partilha o nome e se transforma completamente ao incorporar a personagem feminina da peça de Thomas? Vanda surge como a personificação do ideal de actriz que o encenador procura. Será que ela existe ou é apenas fruto da imaginação dele? Vénus de Vison é o retrato mordaz de um autor atraiçoado pela própria criação.
Para além das excelentes personagens, a longa-metragem de Polanski destaca-se igualmente pelos pequenos pormenores como os objectos invisíveis que se revelam através dos sons, genialmente presentes. Sabemos onde está a chávena, o pires ou a colher mesmo sem os ver. Ao mesmo tempo, tecnicamente, o realizador movimenta-se como ninguém num único espaço, coloca-nos muitas vezes na pele de Vanda - o início e final do filme são os exemplos mais flagrantes e que aguçam o carácter quase imaginário da personagem -, a fotografia de Pawel Edelman joga com luz e sombra tão perfeitamente como Vanda sabe iluminar o palco do teatro perante o olhar incrédulo de Thomas. A acompanhar toda a atmosfera teatral e dominadora - até do espectador - está a delicada e muito adequada banda sonora de Alexandre Desplat.
Emmanuelle Seigner e Mathieu Amalric são a alma de Vénus de Vison. A química entre ambos é evidente, e a energia e entrega às personagens são enormes. Amalric mostra uma vez mais o talentoso e versátil actor que é na pele do exigente e perturbado Thomas. Já Seigner oferece-nos um desempenho fabuloso como Vanda, esta mulher vulgar mas surpreendente, sensual, vingativa e desequilibrada.
Vénus de Vison está repleto de jogos de poder e de sedução. Machismo - "E o Senhor o feriu pela mão de uma mulher", já Vanda se queixava - , feminismo, travestismo ou masoquismo, encontramos de tudo neste trabalho de Polanski. Mas Vanda parece sair sempre por cima, contrariando a reticência inicial de Thomas. Ela seduz, mas não se deixa seduzir, ela irrita-o, humilha-o, mas, acima de tudo, ela é tudo aquilo que ele imaginou.
O poder, tão central em Vénus de Vison, começa por ser detido por Thomas, o encenador saturado de procurar a sua Vanda. Ele nega-se a fazer a audição da atrasada actriz, com tão maus modos e -aparentemente - poucos conhecimentos dramáticos. Todavia, rapidamente é Vanda que passa a deter o poder, contestando, surpreendendo e dominando o seu avaliador. E mesmo quando os papéis se voltam a inverter, é ela que o subjuga, novamente.
E é na personagem feminina que reside o mistério que perdura até ao final. Quem é esta mulher, que partilha o nome e se transforma completamente ao incorporar a personagem feminina da peça de Thomas? Vanda surge como a personificação do ideal de actriz que o encenador procura. Será que ela existe ou é apenas fruto da imaginação dele? Vénus de Vison é o retrato mordaz de um autor atraiçoado pela própria criação.
Para além das excelentes personagens, a longa-metragem de Polanski destaca-se igualmente pelos pequenos pormenores como os objectos invisíveis que se revelam através dos sons, genialmente presentes. Sabemos onde está a chávena, o pires ou a colher mesmo sem os ver. Ao mesmo tempo, tecnicamente, o realizador movimenta-se como ninguém num único espaço, coloca-nos muitas vezes na pele de Vanda - o início e final do filme são os exemplos mais flagrantes e que aguçam o carácter quase imaginário da personagem -, a fotografia de Pawel Edelman joga com luz e sombra tão perfeitamente como Vanda sabe iluminar o palco do teatro perante o olhar incrédulo de Thomas. A acompanhar toda a atmosfera teatral e dominadora - até do espectador - está a delicada e muito adequada banda sonora de Alexandre Desplat.
Emmanuelle Seigner e Mathieu Amalric são a alma de Vénus de Vison. A química entre ambos é evidente, e a energia e entrega às personagens são enormes. Amalric mostra uma vez mais o talentoso e versátil actor que é na pele do exigente e perturbado Thomas. Já Seigner oferece-nos um desempenho fabuloso como Vanda, esta mulher vulgar mas surpreendente, sensual, vingativa e desequilibrada.
Com Vénus de Vison, Roman Polanski volta aos temas fortes onde o poder é o grande motor da acção. O pesadelo dos autores é incorporado por Emmanuelle Seigner que trará ao de cima toda a perversidade escondida numa peça de teatro e na mente de um encenador.
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