*7.5/10*
Júlio Bressane foi o Herói Independente do IndieLisboa'11 e, agora em 2014, marca presença na secção Observatório com o filme Educação Sentimental.
Baseado no mito grego de Selene e Endimião, da lua que se apaixona por um mortal e o condena ao sono eterno, como a protagonista explica ainda no início da longa-metragem, Educação Sentimental resulta do encontro entre Áurea, uma professora solitária e conhecedora da literatura, e Áureo, um rapaz inculto que só conhece o desejo físico, em que é mais experiente. Ela sabe muito, fala e declama as coisas que leu; ele escuta e nem sempre a compreende. Pouco a pouco, ele parece assimilar as lições que lhe são ditadas pela apaixonada Áurea. Os dois não podiam ser mais distantes, mas apesar do improvável romance, ele deixa-se levar para o passado de que ela fala, quando lia e escrevia, quando a literatura existia e impunha um ritmo próprio, contrastando com o ritmo frenético do mundo exterior.
Apesar do tom marcadamente experimental, em Educação Sentimental há muita paixão e poética. O texto é fabuloso, marcado pelos monólogos de Áurea, dos quais é impossível desviar a atenção, pelos comentários ingénuos de Áureo, pela conversa quase surreal entre Áurea e a mãe do jovem... Ao mesmo tempo, as palavras são acompanhadas e complementadas pelos gestos, pela dança e pela música que, mesmo quando não está presente se sente.
A teatralidade de cada cena é quase mágica, e a ela se junta o rigor técnico de Bressane, com uma mise-en-scène perfeita. A bonita fotografia destaca-se pelo excelente trabalho de iluminação, onde a Lua se funde com Áurea e Áureo. Apesar de nem tudo (ou mesmo muito pouco) ter um significado óbvio, caberá a cada espectador tirar as suas conclusões - se quiser, pois se optar apenas por desfrutar desta obra marcadamente estética não ficará desiludido.
Em par com esta história de amor tão pouco comum está uma desconstrução e apelo à memória do cinema - Bressane mostra-nos os microfones, os focos de luz, mas relembra igualmente a película, cada vez mais esquecida. Com Áurea, e tal como Áureo, a plateia embarca numa viagem de nostalgia. Aprende e apreende muito do passado da professora, conhecendo-a mais intimamente, mas percorre igualmente o passado da literatura, dos poetas que morreram jovens, da música e do cinema.
Educação Sentimental é uma obra a descobrir, dando-lhe o espaço que ela pede, o tempo para ser assimilada e o olhar atento e deslumbrado pelo visual cheio de cor, de movimento e de emoções à flor da pele.
1 comentário:
O IndieLisboa 2014 começou de excelente maneira!
Bom texto a um óptimo filme.
Cumps cinéfilos :*
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