quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Crítica: O Traidor / Il traditore (2019)

*8/10*


A máfia italiana tem material de sobra para cinema e O Traidor, de Marco Bellocchio, é prova disso mesmo. Uma longa-metragem que mergulha na vida de uma personagem real, Tommaso Buscetta, com uma interpretação poderosa de Pierfrancesco Favino.

Itália, anos 80. O país é palco de uma guerra acesa pelo negócio da heroína entre os chefes da máfia siciliana. Tommaso Buscetta, um homem marcado, foge para o Brasil, onde acompanha à distância o assassinato dos seus filhos e do seu irmão, em Palermo. Preso e extraditado para Itália pela polícia brasileira, Buscetta decide encontrar-se com o juiz Giovanni Falcone e trair o juramento de lealdade eterna que fizera à Cosa Nostra, colaborando no super processo histórico que irá condenar mais de 400 membros da Máfia.


Marco Bellocchio cria uma obra ritmada e envolvente, que não queremos parar de ver. O argumento tem potencial, explorando a história real em torno do ex-mafioso, que se tornou no primeiro denunciador da máfia italiana. 

O realizador filma com destreza as festas da Cosa Nostra, os crimes, a tortura no Brasil e os julgamentos, por vezes como uma dança, com musicalidade. Por outro lado, o realizador sabe usar os planos-sequência para cativar a atenção da plateia. Acima de tudo, Bellocchio sabe contar uma boa história. Tão depressa nos põe a sorrir com os maneirismos das famílias da máfia, ou os exageros dos detidos no tribunal, como nos põe vigilantes na eminência de uma ameaça. 

O protagonista Pierfrancesco Favino tem um desempenho muito consistente, na pele de um homem que vemos envelhecer no ecrã. Vemo-lo jovem, de meia idade e já idoso, e nunca duvidamos da interpretação do actor. O medo que sempre acompanhou Tommaso está espelhado no rosto de Favino, desconfiado a cada passo que dá, do café que bebe, da comida que come, do cigarro que fuma, do homem que toca e canta canções no restaurante... Quem trai a máfia nunca mais terá um momento de paz,  vivendo em constante obsessão - e com razão.


O Traidor, de Marco Bellocchio, é bom cinema, em jeito de homenagem aos que contribuíram para desmascarar a máfia italiana dos anos 80 e, claro, às suas vítimas - sendo a mais flagrante o juiz Giovanni Falcone.

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