"Il n'y a ni mauvaises herbes ni mauvais hommes. Il n'y a que de mauvais cultivateurs."
Victor Hugo
*8.5/10*
Na sua primeira longa-metragem, Os Miseráveis, Ladj Ly confronta a França e o Mundo com a raiz dos seus problemas sociais, numa analogia certeira com o romance homónimo de Victor Hugo. Ao citar o autor, no final do filme, resume bem a poderosa mensagem que pretende passar.
Stéphane (Damien Bonnard), acabado de chegar de Cherbourg, vai integrar a Brigada Anti-Crime (BAC) de Montfermeil, nos arredores de Paris. É aí que conhece os seus novos colegas de equipa, Chris (Alexis Manenti) e Gwada (Djebril Zonga), dois agentes experientes. Não tarda a descobrir as tensões entre os diferentes gangues locais. Durante uma detenção, um drone filma todos os seus actos e gestos. Seguem-se as consequências.
Ladj Ly traça um retrato cru da realidade onde cresceu e onde tantos jovens criam o seu caminho, a cada dia que passa. Num local pobre, onde vivem imigrantes e seus filhos já nascidos em França, cruzam-se, diariamente, nacionalidades, etnias e religiões, sem mediadores. A polícia entra no mecanismo que faz aquela comunidade conviver - com muitas disfuncionalidades - e é também um veículo meio corrupto e violento.
A instabilidade é permanente para todos os lados da equação, mas são as crianças e jovens quem mais sofre com a discriminação e o preconceito. A plateia sentir-se-á um estranho, tal como o "novato" Stéphane, naquela forma de funcionar dos agentes da polícia. Afinal, a quem cabe o dever de proteger os cidadãos?
Ladj Ly leva-nos pelas ruas de Montfermeil através do carro da polícia, mas também as sobrevoa no drone do curioso Buzz (Al-Hassan Ly), ou corre ao lado do grupo de jovens que quer proteger Issa (Issa Perica) da brutalidade que se avizinha. O realismo das suas imagens poderia confundir-se com o documental, e, para além da ficção - tão inspirada e quase surreal a certo momento -, é capaz de captar costumes e formas de viver da comunidade.
Os Miseráveis é um thriller revolucionário e reaccionário que grita por socorro, ao país e ao mundo, e torna visíveis aqueles que a sociedade automaticamente ostraciza e coloca à margem, com rótulos e sem esperança de futuro.
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