*9/10*
Basil da Cunha regressa ao bairro da Estrada Militar, na Reboleira, onde tem construído a quase totalidade da sua filmografia. Em 2720 (que é também o código postal desta zona da cidade), vários planos-sequência conduzem a plateia pelas casas, ruas, estradas e becos do bairro, seguindo alternadamente os dois protagonistas, entre encontros e desencontros.
"Um bairro clandestino na Reboleira acorda com a notícia de uma violenta rusga policial, que aconteceu na noite anterior. Camila, uma menina de 7 anos, parte em busca do irmão, Igor. Está preocupada. Igor anda desaparecido. Ao mesmo tempo, Jysone apressa-se: passados 6 anos na cadeia e 5 semanas em liberdade, Jysone finalmente encontrou trabalho e sabe que não pode chegar atrasado. Está à procura de alguém que lhe possa dar boleia enquanto caminha pelos becos do bairro, onde se vai cruzando com amigos e conhecidos, que o atrasam ainda mais. O destino dos nossos dois protagonistas vai acabar por se cruzar da pior forma possível."
Através da câmara de Basil da Cunha, eis que os habitantes do bairro levam a plateia numa visita guiada. Todos se conhecem e a maioria das portas estão abertas a quem chega, incluindo à visão do realizador, que espreita cada divisão e os seus moradores, evidenciando a enorme familiaridade que ali se vive. Em contraste, nas ruas impera um cenário triste e decadente, resultado das demolições que se vão sucedendo e começaram há alguns anos. Paredes que já não sustentam a casa que ali existiu, lixo e entulho do que foi deixado para trás pelos que partiram, e o abandono que paira sobre o bairro, com a polícia sempre à espreita.
Em 24 minutos, consegue-se traçar um rápido retrato socioeconómico do bairro, entre crianças que cresceram mais rápido do que a idade faz crer, jovens desempregados, ex-reclusos que querem recompor a vida, o medo e a revolta para com a polícia - e da violência da relação entre as duas partes -, mas, principalmente, um espírito de união e companheirismo admirável.
A subtileza de Basil da Cunha vai deixando pistas ao longo da curta-metragem, e filma o bairro através do olhar e das emoções dos protagonistas - a pequena Camila é o principal reflexo disso.
2720 é o seguimento do trabalho quase etnográfico que o realizador tem feito desta zona da Amadora, que tem desaparecido aos poucos, mas continuará sempre reunida na sua obra.
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