*6.5/10*
Desafiante e perturbadora é o que se pode dizer da possibilidade um tanto arrepiante que Jonathan Glazer evoca com Debaixo da Pele. Não é todos os dias que reflectimos sobre a presença de extraterrestres na Terra, nem sobre o seu comportamento e consequente adaptação à humanidade e seus hábitos e valores. Essencialmente sensorial e estético, Debaixo da Pele leva-nos a seguir os passos de Scarlett Johansson na pele de uma predadora sexy e sem emoções, que, aos poucos, inicia o seu processo de humanização.
Falta contudo que o caminho que seguimos seja mais coerente. O argumento - cuja premissa é excelente - não prima pela consistência e prefere deixar vazios inexplicáveis por preencher. Talvez nem tudo tenha de ser justificado, mas a dinâmica de Debaixo da Pele - especialmente lenta ao longo da sua primeira metade - sairia favorecida com uma condução mais digna e com acontecimentos verdadeiramente marcantes para o espectador, deixando espaço a uma reflexão mais orientada, digamos, e menos dominada por perguntas sem resposta. O ritmo não é o mais empolgante, com uma acentuada diferença entre a primeira e a segunda metade da longa-metragem, que marca igualmente uma importante mudança no comportamento da protagonista.
Scarlett não consegue sobressair como esperado, mas conduz eficazmente esta jornada num planeta para si desconhecido. Inexpressiva, cruel, sensual, ela seduz e aterroriza o espectador tal como faz às suas vítimas, mostrando, aos poucos, uma inesperada curiosidade por si e pelo que a rodeia, e uma ingenuidade quase infantil, totalmente oposta à sua personalidade inicial. A conclusão - quase previsível - é ainda assim uma agradável surpresa - ou revelação -, mas sabe a pouco. Debaixo da Pele chega a encontrar o ritmo certo, mas não imerge fundo o suficiente para que a experiência seja inesquecível.
Tecnicamente, o visual muitas vezes kubrickiano - onde a sequência inicial ganha especial ênfase - mergulha-nos num inferno de interrogações semelhante ao que, mais à frente, verificamos, impotentes, ser o mesmo em que as vítimas da protagonista se afundam. O ambiente sinistro e sombrio - onde os tons escuros e fortes abundam -, adensado pelas paisagens da Escócia, sai favorecido pelo excelente trabalho de fotografia, de Daniel Landin, que joga com o claro/escuro, espelhos e até nevoeiro. A acompanhar todo o visual incómodo está a fantástica e desconfortável banda sonora, de Mica Levi.
Debaixo da Pele não é certamente o filme mais consensual do ano, nem o melhor, mas cativará a atenção dos mais curiosos ou dos que anseiam por novas experiências. Uma reflexão incompleta e inesperada sobre a existência e a humanidade é a proposta - preguiçosa na concretização - de Glazer. Ao fim de algum tempo no mesmo local, quem será mais humano: o Homem ou o Extraterrestre?
3 comentários:
Concordo plenamente com o que diz o texto. No início, parecia que seria mais um daqueles filmes que assisto e logo esqueço, mas quando cheguei a metade do filme não conseguia mais parar, a curiosidade já tomava conta. Gostei muito do final, com certeza ficará na minha memória.
Com certeza um filme inesquecível. Completamente misterioso. Quem for ver, não procure sinopse ou trailer, tenha certeza que seu goste encontra-se requintado.
Achei o seu texto melhor que o filme que também dei nota 6.5 e me criticaram de não ter captado a mensagem ,entendi tudo achei fantástica a variante (um filme bem incomum ,porém que promete muito e depois não responde a altura,uma mensagem simples passada de forma correta que muitos que sentem a necessidade de assistir algo diferente e interpretar como :não gostou ?!Não entendeu ...O que estranho é que a mensagem é simples e achei um tanto pretensiosa e mal defendida pelos amantes da obra,fora as coisas que já citou as locações da Escócia são um ponto alto ,abraço e valeu pelo texto Bacana!
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