O MOTELx começa já no dia 10 de Setembro e para o Prémio MOTELx – Melhor Curta de Terror Portuguesa 2014, o único galardão do festival, estão a concorrer 13 curtas-metragens nacionais: Bodas de Papel (2014), de Francisco Antunez; Contactos 2.0 (2014), de Bernardo Gomes de Almeida e Rodrigo Duvens Pinto; Demência (2014), de Rafael Almeida; Dentes e Garras (2013), de Francisco Lacerda; Epoh (2013), de Pedro Pinto; Forbidden Room (2013), de Emanuel Nevado e Ricardo Almeida; Gata Má (2013), de Eva Mendes, Joana de Rosa e Sara Augusto; Maria (2014), de Joana Viegas; A Morte é o Único Perdão (2014), de Rui Pilão; Offline (2014), de Pedro Rodrigues; Pela Boca Morre o Peixe (2014), de João P. Nunes; Schadenfreude – De Morrer a Rir (2014), de Leonardo Dias, e Se o Dia Chegar (2014), de Pedro Santasmarinas.
Aproveitando o momento, entrevistei Leonardo Dias, a propósito da sua curta-metragem, Schadenfreude – De Morrer a Rir.
De onde surgiu a ideia para De Morrer a Rir?
Leonardo Dias: Coincidência ou não, a ideia para De Morrer a Rir começou a ser esboçada há um ano atrás, exatamente no festival onde irá agora ter a sua estreia absoluta: o MOTELx. Encontrei-me com o António (um dos outros produtores) num dos corredores do São Jorge, na passada edição do festival, e ele disse-me que tinha uma proposta para me fazer. Tinha acabado de ver o ABCs of Death (uma coletânea internacional de curtas-metragens que tinham a morte como temática, cada uma assinada por um realizador diferente) e estava entusiasmado para participar num concurso de curtas que os produtores dessa coletânea tinham aberto ao público. A ideia era concorrer com curtas-metragens de um minuto apenas, sendo que a vencedora teria o seu lugar na próxima edição da coletânea. Ele sabia que eu, há uns anos atrás, tinha co-realizado um slasher movie cómico, com budget zero, e veio desafiar-me para participar com ele: co-escrever, co-produzir e co-realizar. Eu disse-lhe que achava que a nossa equipa era demasiado pequena ainda para dar uma resposta rápida e de qualidade a um concurso desses, com uma deadline tão apertada, mas como adoro pessoas sonhadoras (porque também sou uma) e não resisto a um desafio, aceitei e começámos o brainstorming. A ideia surgiu-me umas semanas depois e apresentei-lhe quando nos voltámos a encontrar numa sessão do Shortcutz, no Bicaense. Ele gostou e decidimos avançar, produzindo-a do nosso bolso. Claro que não chegámos a concorrer ao tal concurso. A ideia era demasiado ambiciosa para se produzir rapidamente e a história não cabia num minuto, por muito que a "espremêssemos". Não estou arrependido. Acho que a curta vale por si. Por motivos profissionais e familiares, o António acabou por ter de se afastar do projeto, logo numa fase inicial, e nem teve tempo para estar presente em todos os dias de rodagem. Fui eu que então tive de tomar as rédeas e assumir a autoria do projeto, levando-o até ao fim, ficando o António como produtor-investidor e co-argumentista. O Rui (último dos três produtores), com quem já trabalho há algum tempo, acabou por se juntar também e acompanhou toda a fase de pré-produção e produção, tendo sido para além de co-argumentista e co-produtor, diretor de fotografia e assistente de realização. "Fast forward" um ano e De Morrer a Rir está filmado, montado, sonorizado, pós-produzido e pronto a estrear no festival que, de certa forma, o criou.
O que distingue esta curta-metragem?
L.D.: Não é fácil para mim, enquanto autor, responder a uma pergunta destas. Implica um certo distanciamento, numa altura em que já vi o filme (se é que se pode chamar filme a uma obra de cinco minutos) tantas vezes, de trás para a frente e da frente para trás, que já nem o acho engraçado! Penso que as suas principais características são a violência "cartoonesca", acompanhada de uma certa poesia bucólica. É um filme trash, filmado de uma forma relativamente elegante, com preocupações pouco habituais nos filmes do género. O kitsch e o novo-riquismo decadente fazem parte da estética duma obra que se assemelha a um cartoon de mau gosto. O ritmo do filme é também algo notável. Cortado de forma muito rápida, ao estilo MTV, esta curta de cinco minutos consegue conter mais ação que muitas longas-metragens portuguesas.
O que é que o público pode esperar de De Morrer a Rir? Mais terror ou mais humor?
L.D.: Mais humor, sem dúvida. De Morrer a Rir é, acima de tudo, uma comédia. Mas é uma comédia negra, perversa. Provoca-nos quando nos incita a rir da desgraça dos personagens. E, aliás, é esse mesmo o tema do filme. Aquele prazer egoísta que o ser humano sente quando vê outro a cair em desgraça e que, segundo sei, apenas os alemães foram capazes de descrever numa só palavra: schadenfreude. Está presente quando nos rimos do palhaço no circo que tropeça no balde de água ou quando vemos um administrador de um famoso banco ser preso pelas fraudes fiscais em que esteve envolvido. Algo extremamente ligado ao sentimento de vingança e que parece aumentar consoante o grau de inveja ou repulsa sentido em relação ao lesado. No filme, os próprios personagens riem-se um do outro, e, no que toca à realização, dei privilégio aos planos POV (pontos-de-vista) em detrimento dos planos over-the-shoulder (sobre o ombro), para que o espetador "entre dentro" da pele dos personagens. Afinal, não será o espetador exatamente igual a eles? Alguém que se ri da desgraça dos outros, sabendo que está à distância confortável de uma tela de cinema?
Como é ver a sua curta-metragem seleccionada para a corrida ao prémio para Melhor Curta de Terror Portuguesa do MOTELx?
L.D.: Acho muito importante que se criem incentivos como este à produção cinematográfica nacional. A maior parte dos concursos e festivais de curtas que se fazem neste país oferecem um troféu ou um certificado ao vencedor e, em alguns destes, ainda é preciso pagar a inscrição da obra no concurso! Por muito que goste de troféus, não consigo alimentar uma equipa de produção com eles. E os atores não aceitam certificados como cachet (infelizmente já faltou mais!). É preciso dinheiro para se fazer cinema, por muito low-budget e guerrilha que seja a produção, por isso um incentivo monetário é essencial, especialmente para um meio como a curta-metragem, que não gera, por norma, retorno financeiro. Claro que o prémio do MOTELx é (ainda) pequeno mesmo assim, mas é um bom começo. Acredito que a maioria das curtas, se ganhasse, veria o retorno do investimento e ainda sobraria algum para ajudar na produção da próxima obra. De qualquer forma, mais que o prémio, aquilo que para nós é importante é ver o nosso esforço reconhecido e, acima de tudo, dar a conhecer o nosso trabalho. É importante que as pessoas saibam quem somos e o que fazemos. E, para esta curta específica, talvez não haja melhor festival neste país que o MOTELx, pois o público-alvo é exatamente aquele que queremos atingir com esta curta.
Quais as suas principais influências cinematográficas?
L.D.: Sei que é cliché dizer isto, mas vejo (e gosto de ver) todo o tipo de filmes. No entanto, desde que o meu pai me mostrou A Guerra das Estrelas quando eu era criança, que tenho um fraquinho pelo fantástico e pela ficção científica. Sou fã da obra do Ridley Scott (com filmes como Blade Runner e Alien) e da obra do que, para mim, é um dos realizadores mais subvalorizados de sempre: Terry Gilliam (12 Monkeys, Brazil). Talvez por ser um Monty Python a malta não o leve muito a sério. Eu acho-o genial. Depois gosto do Lynch, Kubrick, Scorsese, Nolan, dos irmãos Wachowski e dos Coen e, no que toca a gore e a produções de orçamentos mais restritos (para me aproximar à curta em competição), Carpenter e Peter Jackson (em inícios de carreira). Para enumerar influências mais antigas, admiro os filmes do expressionismo alemão (como Metropolis ou o Gabinete do Dr. Caligari) e a obra do mestre Luis Buñuel. O seu filme Viridiana, um dos meus favoritos de sempre, também me poderá ter influenciado bastante nesta curta-metragem, ainda que inconscientemente. E claro que não se pode falar em curtas fantásticas, ou em efeitos especiais, sem falar do seu avô Georges Méliès (a quem prestei uma subtil homenagem nesta curta, só para os espetadores mais atentos). Quanto ao cinema português, admito que não é uma das minhas principais fontes de inspiração. Gosto, no entanto, da minúcia com que realizadores como Manoel de Oliveira compõem um plano. E penso que o gosto pela utilização de planos estáticos e milimetricamente compostos é algo que herdei dos cineastas portugueses. Por fim, recentemente surgiu uma nova vaga de realizadores ultra-violentos, que trabalham com orçamentos baixos, a que deram a alcunha de "splat pack". Dele fazem parte James Wan (Saw), Eli Roth (Hostel) e Neil Marshall (que, por exemplo, realizou alguns episódios da famosa série Game of Thrones, como o da batalha de Blackwater Bay), entre outros realizadores. Este "pack" também tem sido uma grande influência para mim. Gosto de filmes que me perturbem um pouco, que me provoquem e me deem sensações fortes. A arte pode (e deve) ser uma provocação.
Facebook da equipa do filme Schadenfreude – De Morrer a Rir
De onde surgiu a ideia para De Morrer a Rir?
Leonardo Dias: Coincidência ou não, a ideia para De Morrer a Rir começou a ser esboçada há um ano atrás, exatamente no festival onde irá agora ter a sua estreia absoluta: o MOTELx. Encontrei-me com o António (um dos outros produtores) num dos corredores do São Jorge, na passada edição do festival, e ele disse-me que tinha uma proposta para me fazer. Tinha acabado de ver o ABCs of Death (uma coletânea internacional de curtas-metragens que tinham a morte como temática, cada uma assinada por um realizador diferente) e estava entusiasmado para participar num concurso de curtas que os produtores dessa coletânea tinham aberto ao público. A ideia era concorrer com curtas-metragens de um minuto apenas, sendo que a vencedora teria o seu lugar na próxima edição da coletânea. Ele sabia que eu, há uns anos atrás, tinha co-realizado um slasher movie cómico, com budget zero, e veio desafiar-me para participar com ele: co-escrever, co-produzir e co-realizar. Eu disse-lhe que achava que a nossa equipa era demasiado pequena ainda para dar uma resposta rápida e de qualidade a um concurso desses, com uma deadline tão apertada, mas como adoro pessoas sonhadoras (porque também sou uma) e não resisto a um desafio, aceitei e começámos o brainstorming. A ideia surgiu-me umas semanas depois e apresentei-lhe quando nos voltámos a encontrar numa sessão do Shortcutz, no Bicaense. Ele gostou e decidimos avançar, produzindo-a do nosso bolso. Claro que não chegámos a concorrer ao tal concurso. A ideia era demasiado ambiciosa para se produzir rapidamente e a história não cabia num minuto, por muito que a "espremêssemos". Não estou arrependido. Acho que a curta vale por si. Por motivos profissionais e familiares, o António acabou por ter de se afastar do projeto, logo numa fase inicial, e nem teve tempo para estar presente em todos os dias de rodagem. Fui eu que então tive de tomar as rédeas e assumir a autoria do projeto, levando-o até ao fim, ficando o António como produtor-investidor e co-argumentista. O Rui (último dos três produtores), com quem já trabalho há algum tempo, acabou por se juntar também e acompanhou toda a fase de pré-produção e produção, tendo sido para além de co-argumentista e co-produtor, diretor de fotografia e assistente de realização. "Fast forward" um ano e De Morrer a Rir está filmado, montado, sonorizado, pós-produzido e pronto a estrear no festival que, de certa forma, o criou.
O que distingue esta curta-metragem?
L.D.: Não é fácil para mim, enquanto autor, responder a uma pergunta destas. Implica um certo distanciamento, numa altura em que já vi o filme (se é que se pode chamar filme a uma obra de cinco minutos) tantas vezes, de trás para a frente e da frente para trás, que já nem o acho engraçado! Penso que as suas principais características são a violência "cartoonesca", acompanhada de uma certa poesia bucólica. É um filme trash, filmado de uma forma relativamente elegante, com preocupações pouco habituais nos filmes do género. O kitsch e o novo-riquismo decadente fazem parte da estética duma obra que se assemelha a um cartoon de mau gosto. O ritmo do filme é também algo notável. Cortado de forma muito rápida, ao estilo MTV, esta curta de cinco minutos consegue conter mais ação que muitas longas-metragens portuguesas.
O que é que o público pode esperar de De Morrer a Rir? Mais terror ou mais humor?
L.D.: Mais humor, sem dúvida. De Morrer a Rir é, acima de tudo, uma comédia. Mas é uma comédia negra, perversa. Provoca-nos quando nos incita a rir da desgraça dos personagens. E, aliás, é esse mesmo o tema do filme. Aquele prazer egoísta que o ser humano sente quando vê outro a cair em desgraça e que, segundo sei, apenas os alemães foram capazes de descrever numa só palavra: schadenfreude. Está presente quando nos rimos do palhaço no circo que tropeça no balde de água ou quando vemos um administrador de um famoso banco ser preso pelas fraudes fiscais em que esteve envolvido. Algo extremamente ligado ao sentimento de vingança e que parece aumentar consoante o grau de inveja ou repulsa sentido em relação ao lesado. No filme, os próprios personagens riem-se um do outro, e, no que toca à realização, dei privilégio aos planos POV (pontos-de-vista) em detrimento dos planos over-the-shoulder (sobre o ombro), para que o espetador "entre dentro" da pele dos personagens. Afinal, não será o espetador exatamente igual a eles? Alguém que se ri da desgraça dos outros, sabendo que está à distância confortável de uma tela de cinema?
Como é ver a sua curta-metragem seleccionada para a corrida ao prémio para Melhor Curta de Terror Portuguesa do MOTELx?
L.D.: Acho muito importante que se criem incentivos como este à produção cinematográfica nacional. A maior parte dos concursos e festivais de curtas que se fazem neste país oferecem um troféu ou um certificado ao vencedor e, em alguns destes, ainda é preciso pagar a inscrição da obra no concurso! Por muito que goste de troféus, não consigo alimentar uma equipa de produção com eles. E os atores não aceitam certificados como cachet (infelizmente já faltou mais!). É preciso dinheiro para se fazer cinema, por muito low-budget e guerrilha que seja a produção, por isso um incentivo monetário é essencial, especialmente para um meio como a curta-metragem, que não gera, por norma, retorno financeiro. Claro que o prémio do MOTELx é (ainda) pequeno mesmo assim, mas é um bom começo. Acredito que a maioria das curtas, se ganhasse, veria o retorno do investimento e ainda sobraria algum para ajudar na produção da próxima obra. De qualquer forma, mais que o prémio, aquilo que para nós é importante é ver o nosso esforço reconhecido e, acima de tudo, dar a conhecer o nosso trabalho. É importante que as pessoas saibam quem somos e o que fazemos. E, para esta curta específica, talvez não haja melhor festival neste país que o MOTELx, pois o público-alvo é exatamente aquele que queremos atingir com esta curta.
Quais as suas principais influências cinematográficas?
L.D.: Sei que é cliché dizer isto, mas vejo (e gosto de ver) todo o tipo de filmes. No entanto, desde que o meu pai me mostrou A Guerra das Estrelas quando eu era criança, que tenho um fraquinho pelo fantástico e pela ficção científica. Sou fã da obra do Ridley Scott (com filmes como Blade Runner e Alien) e da obra do que, para mim, é um dos realizadores mais subvalorizados de sempre: Terry Gilliam (12 Monkeys, Brazil). Talvez por ser um Monty Python a malta não o leve muito a sério. Eu acho-o genial. Depois gosto do Lynch, Kubrick, Scorsese, Nolan, dos irmãos Wachowski e dos Coen e, no que toca a gore e a produções de orçamentos mais restritos (para me aproximar à curta em competição), Carpenter e Peter Jackson (em inícios de carreira). Para enumerar influências mais antigas, admiro os filmes do expressionismo alemão (como Metropolis ou o Gabinete do Dr. Caligari) e a obra do mestre Luis Buñuel. O seu filme Viridiana, um dos meus favoritos de sempre, também me poderá ter influenciado bastante nesta curta-metragem, ainda que inconscientemente. E claro que não se pode falar em curtas fantásticas, ou em efeitos especiais, sem falar do seu avô Georges Méliès (a quem prestei uma subtil homenagem nesta curta, só para os espetadores mais atentos). Quanto ao cinema português, admito que não é uma das minhas principais fontes de inspiração. Gosto, no entanto, da minúcia com que realizadores como Manoel de Oliveira compõem um plano. E penso que o gosto pela utilização de planos estáticos e milimetricamente compostos é algo que herdei dos cineastas portugueses. Por fim, recentemente surgiu uma nova vaga de realizadores ultra-violentos, que trabalham com orçamentos baixos, a que deram a alcunha de "splat pack". Dele fazem parte James Wan (Saw), Eli Roth (Hostel) e Neil Marshall (que, por exemplo, realizou alguns episódios da famosa série Game of Thrones, como o da batalha de Blackwater Bay), entre outros realizadores. Este "pack" também tem sido uma grande influência para mim. Gosto de filmes que me perturbem um pouco, que me provoquem e me deem sensações fortes. A arte pode (e deve) ser uma provocação.
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