quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Crítica: Carga (2018)

"The road is long but nobody said it was easy..."
Viktoriya


*7.5/10*

Entre as paisagens geladas da Serra da Estrela e os quartos escuros de casarões abandonados, abrem-nos os olhos para a realidade cruel do tráfico de seres humanos. Carga é o corajoso filme português, realizado por Bruno Gascon, que quer despertar consciências e denunciar um problema global.

Um thriller onde as mulheres são vítimas mas igualmente heroínas, Carga é uma surpresa violenta e bem concretizada, com um leque de actores que dão tudo, e que vão de nomes conceituados como Vítor Norte à estreante Sara Sampaio, a modelo que quer ser actriz - e não se sai nada mal.

Esta é a história de Viktoriya (Michalina Olszanska), uma jovem russa apanhada numa rede de tráfico ilegal, que apenas tem uma hipótese: lutar para sobreviver; e de António (Vítor Norte), um velho camionista que se cruza no caminho da jovem, despoletando um encontro que o leva a questionar todos os seus princípios.


Eis um tema de difícil abordagem, poucas vezes filmado no cinema. Carga transmite-nos o frio, o medo e o desespero que rodeiam as personagens. A tensão é crescente e, até ao final, Bruno Gascon oferece-nos planos bem estudados e algumas mensagens subtis tanto acerca das personagens como sobre o enredo.

Carga é falado em três línguas diferentes (inglês, português e russo), e o silêncio está muito presente, quer pelas dificuldades de comunicação, quer pelo sigilo que convém guardar dos crimes e ilegalidades que se passam naquele submundo. As ameaças são muitas e a desconfiança paira sobre traficadas e traficantes. Curiosamente, todas as personagens têm uma dualidade muito realista. Têm personalidades fortes, fraquezas e segredos. Este é um dos pontos mais fortes do filme, que o aproximam ainda mais do público.

No elenco, encontramos grandes desempenhos. A protagonista Michalina Olszanska tem uma forte presença e magnetismo, incorporando todo o sofrimento de Viktoriya de uma forma muito natural.  O veterano Vítor Norte é o homem que vive numa luta interior, tão culpado como subjugado pela rede de tráfico. Dmitry Bogomolov é Viktor, manipulador, sem escrúpulos, que quase não manifesta emoções. Ana Cristina Oliveira tem poucos minutos no ecrã mas conquista todas as atenções com a sua Sveta, em especial, num fabuloso monólogo, em que revela toda a dor que carrega, ao lado de Sara Sampaio. A modelo é a cara das jovens traficadas e sai-se muito bem no seu primeiro papel, emotiva e segura de si. Duarte Grilo e Miguel Borges surgem como homens fortes de Viktor, ambos num conflito interno, lutando para não mostrar fraquezas.


Carga só peca por um clímax demasiado prolongado, onde surgem flashbacks que poderiam funcionar melhor com uma montagem diferente. A banda sonora, por sua vez, é um dos pontos fortes da longa-metragem.

Um filme cheio de girl power, que realça as mulheres como grandes lutadoras que são, Carga marca uma nova etapa no cinema português, com um certo activismo latente, numa denúncia acesa da violência que é o tráfico humano, sem receios, nem tabus. 

1 comentário:

Unknown disse...

Violência barata e desnecessária