Escrevemos sobre as curtas-metragens da competição Cinema Falado do Porto/Post/Doc 2022: O Homem do Lixo, O Banho, Mangrove School, Águas e Espelhos e Solmatalua.
O Homem Do Lixo / The Garbage Man, de Laura Goncalves
"Numa tarde quente de Agosto, a família junta-se à mesa. As memórias de cada um recordam a história do tio Botão, que tinha uma carrinha cheia de 'lixo' onde guardava verdadeiros tesouro."
Laura Gonçalves oferece uma mesa cheia de memórias. Uma reunião de família, à refeição, é o momento ideal para lembrar o tio Manuel, cuja história se cruza com a de muitos portugueses, entre a Guerra Colonial e a emigração para França, em que o regresso à terra era motivo de festa e admiração.
O som de um almoço de família real encaixa nas imagens, onde, a guiar a câmara, está o macaco que Manuel adoptou em África. Um companheiro curioso, que percorre a mesa e os tachos, enquanto escuta, atento, cada história, tal qual a plateia.
A animação de O Homem do Lixo condiz com o espírito de nostalgia e alegria que se vive na sala. Fotografias e objectos ajudam a ilustrar as recordações que todos guardam deste homem que recuperava tudo o que outros deitavam ao lixo.
O Banho, de Maria Inês Gonçalves
"A água, nas suas múltiplas manifestações (dos banhos de imersão à rega automática), cruza-se com a genealogia humana (da infância à velhice). O Banho é um retábulo caleidoscópico de sensações familiares onde o prazer e o medo da água se revelam em delicados espasmos visuais, captados em película de 16mm revelada de forma artesanal."
Através do elemento Água, Maria Inês Gonçalves filma partes do ciclo da vida e da Natureza, deixando o experimentalismo inspirar a imaginação e as formas e reflexos que a água permite captar.
A opção de filmar O Banho em 16mm sublinha o caracter analógico da vida e da experiência de interacção com a água, que marca tantos momentos-chave da existência. Uma curta-metragem imersiva que apela à introspecção.
Mangrove School / Skola di Tarafe, de Filipa César e Sónia Vaz Borges
"Nos mangues da Guiné-Bissau, nos anos 1960, durante a guerra, Amílcar Cabral implementou um programa de 'escolas de guerrilha' com o intuito de combater o colonialismo português. Estas escolas nómadas tornaram-se num símbolo de resistência. Mangrove School revisita a história destas escolas numa fábula documental 'é o corpo todo que aprende.'"
Filipa César e Sónia Vaz Borges contam a história das escolas de guerrilha, numa recriação dinâmica e instrutiva, para corpo e mente. Educação, política e arquitectura em tempos de guerra colonial formavam as bases para a implementação destas escolas, a melhor arma na luta contra o inimigo e os locais mais seguros contra os bombardeamentos.
Mangrove School é a união de várias disciplinas através da Natureza e do desejo de independência, numa fascinante viagem no tempo e espaço.
Águas e Espelhos, de Mariana Caló e Francisco Queimadela
"Desenvolvido no âmbito de uma residência artística na Mata do Bussaco (promovida pela Aderno Associação Cultural), Águas e Espelhos marca o regresso da dupla de cineastas ao Porto/Post/Doc. A partir do contacto com o património vegetal, animal, hídrico e edificado desse parque nacional, Caló-Queimadela oferecem-nos um inebriante mergulho (quais Narcisos) na própria natureza das imagens."
Sempre no seu registo experimental, Mariana Caló e Francisco Queimadela convidam a uma visita à Mata do Bussaco a partir de Águas e Espelhos. Os realizadores tocam e sentem a Natureza, e registam-na em película de 16mm.
Em oito minutos, fazem ver e escutar as árvores, a água a correr e os animais, numa experiência cinematográfica sensorial muito íntima, em que os próprios realizadores se filmam e aos seus reflexos. Num jogo de espelhos e luz, o filme constrói-se em plena união com a Natureza.
Solmatalua, de Rodrigo Ribeiro-Andrade
"Depois do espectral A Morte Branca do Feiticeiro Negro (2020), Rodrigo Ribeiro-Andrade assina a sua segunda curta-metragem, uma constelação transtemporal de vozes e presenças negras, entre o mundano e o divino. Solmatalua (Sol-Mata-Lua) propõe um itinerário místico onde se celebra a força ancestral da poesia, das memórias e das vivências negras no Brasil (de ontem, de hoje e, também, do futuro)."
A partir de imagens de arquivo, Rodrigo Ribeiro-Andrade reflecte sobre a presença negra no Brasil e a sua História. Ouve-se poesia, sons da natureza, discursos ou cânticos e tudo é testemunho das memórias de um povo.
Solmatalua é uma experiência que vai do ancestral ao presente, entre florestas, praias, rios, cidades ou favelas, numa viagem cinematográfica através dos tempos.
Toda a informação sobre o Porto/Post/Doc pode ser encontrada em https://www.portopostdoc.com/.
Sem comentários:
Enviar um comentário