"O fantasma do terramoto está muito marcado na nossa memória colectiva"
Francisco
*7/10*
Rita Nunes apresentou na Competição Nacional do IndieLisboa 2024 o seu mais recente filme, O Melhor dos Mundos. Tocando num tema sensível da História de Portugal - o terremoto de 1755 - e a eminência da sua repetição, a realizadora constrói uma narrativa de ficção científica (em parceria com o argumentista João Cândido Zacharias) em torno de um grupo de cientistas especialistas em sismologia e alterações climáticas.
"Lisboa, 2027. Marta e Miguel fazem parte de um grupo de cientistas e são um casal na vida privada. Os dois vêem-se frequentemente em pólos opostos no que diz respeito a questões científicas. Este conflito será posto à prova numa noite decisiva em que dados analisados por Marta apontam para uma probabilidade muito alta de um enorme sismo poder atingir Lisboa. Os cientistas ficam indecisos sobre alertar a população para a possível tragédia iminente."
A questão primordial é: como se comunica uma notícia destas à população, sem a certeza absoluta de que vai mesmo acontecer? E é aqui que começam as dúvidas e cisões entre o grupo, apesar de alguns dos que estão contra comunicar à população serem os primeiros a porem-se, a si e aos seus, a salvo. A ética de cada um destes cientistas ditará a forma como o futuro pode ou não ser "prevenido" - ou minorados os estragos e mortes.
Se, por um lado, Marta tem sérias dificuldades em gerir sentimentos e relações - quer com o seu namorado, quer com a mãe e irmã -, por outro, não tem dúvidas no que toca à responsabilidade profissional que deve assumir na situação que se avizinha. A racionalidade de Marta é fundamental para compreender os fenómenos que o grupo de cientistas regista e é ela, numa competente interpretação de Sara Barros Leitão, que esclarece colegas e plateia sobre as possíveis consequências de um sismo de tal magnitude.
Para a construção de O Melhor dos Mundos, Rita Nunes parte de premissas e pesquisas científicas reais, tal como os novos cabos submarinos instalados em 2025. Com esta ambiência tão realista, apesar de ficcional e, tal como diz Francisco, a certo momento no filme, porque "o fantasma do terramoto está muito marcado na nossa memória colectiva", O Melhor dos Mundos cria uma tensão crescente, muito opressiva quer nas personagens como na plateia.
Com uma fórmula simples, clara e directa, Rita Nunes constrói uma ficção científica - pouco comum no cinema português mais recente - esclarecida, activando no espectador a consciência de um passado que conhece dos livros de História e de um futuro que todos dão como iminente.
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