"I have a new life. Please forgive me."
Karoline
*7/10*
Ao contrário do que muitos dizem, A Rapariga da Agulha não é um filme de terror. Poderá, contudo, perturbar os mais sensíveis, por se inspirar em factos reais. Magnus Von Horn constrói um filme envolto num ambiente pesado e obscuro, onde a esperança está longe de ser alcançável.
A longa-metragem dinamarquesa, "acompanha Karoline, uma jovem grávida e abandonada, que procura sobreviver no pós-Primeira Guerra Mundial, em Copenhaga. Um dia conhece uma mulher que gere uma agência de adopção clandestina, de quem se aproxima, até ao momento em que uma descoberta inesperada muda tudo".
Numa sociedade cruel e desolada pela guerra, Karoline (Vic Carmen Sonne) não tem notícias do marido soldado há um ano e vive em grandes dificuldades. É a protagonista que dá nome ao filme, e logo ao início vêmo-la a fazer tricô e a trabalhar numa fábrica de confecção, onde manuseia máquinas de costura - e são muitas as agulhas que se partem. Entretanto, grávida e abandonada, desespera, até que o marido aparece-lhe, sem explicações e mutilado. Chocada e sem esperança, a protagonista toma decisões precipitadas e confia em Dagmar (aterradora interpretação de Trine Dyrholm), a mulher da loja de doces, que gere, em segredo, uma agência de adopções - a fachada perfeita para o paradoxal negócio que tem dentro de casa.
A Rapariga da Agulha faz várias vítimas ao longo do decorrer da trama, para além das mais óbvias e indefesas. O marido de Karoline, Peter (interpretado por Besir Zeciri), é uma das principais, um ferido de guerra que demonstra, a certo ponto, ser a encarnação da bondade (que escasseia na longa-metragem), num rosto desfeito, escondido atrás de uma máscara. É ele a nova atracção do circo das aberrações local e é assim que vai ganhando a vida que tenta reconstruir - nunca deixando de amar e acolher a mulher quando esta regressa. E é também Karoline, apesar de alguns actos impensados, uma das maiores vítimas da história: desde a dor da ausência à da separação, às dúvidas que a assolam, aos sacrifícios por que passa, quase sempre solitária, com a vida devastada.
O tom pesado e o desenlace abominável, inspirado em acontecimentos reais, que encontram semelhanças em alguns casos pelo mundo, incluindo um em Portugal (Luiza de Jesus, no século XVIII - para evitar spoilers, pesquisem só depois de ver o filme), faz com que A Rapariga da Agulha não seja um filme consensual. Magnus Von Horn desafia os limites do drama, criando um incómodo latente na plateia.
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