sábado, 26 de outubro de 2019

Doclisboa'19: Raposa / Reynard (2019)

*8/10*

Raposa, de Leonor Noivo, faz parte da Competição Portuguesa do Doclisboa'19, depois de ter passado por vários festivais de cinema internacionais. A curta-metragem aborda a anorexia de forma íntima e nasce da relação de amizade entre a actriz Patrícia Guerreiro e a realizadora.


"Astuta e esguia, acossada e em fuga, Raposa é uma metáfora de uma obsessão sem fim por cada respiração, cada gesto, cada pensamento. Marta procura, no vazio do seu corpo, o caminho para uma qualquer essência de si, numa busca abstracta de um espírito livre que pode acabar na sua própria clausura" é o que nos diz a sinopse de Raposa. O animal simboliza aqui a anorexia que assombra a existência de tantas pessoas no mundo, entre elas Leonor Noivo e Patrícia Guerreiro.

As duas trabalharam nesta curta-metragem entre Março de 2017 e Fevereiro de 2019, construindo-a através das suas próprias experiências, bem como de testemunhos de doentes do Hospital de Santa Maria.

Raposa é rodado em 16mm, numa espécie de diário da protagonista Marta. As obsessões e o controlo excessivo que exerce sobre si mesma (contabilizando tudo, as quantidades de comida, e o seu peso), fazem-nos ter uma ideia da terrível realidade que é viver num corpo em constante luta consigo mesmo. Ao mesmo tempo, a doença fá-la recusar qualquer prazer, qualquer sensação boa, caso contrário sentir-se-á culpada e quererá punir-se. Como se dois seres habitassem o mesmo corpo.

Marta fala da sua vontade e mudar de vida, procura ajuda no hospital - onde é-nos sugerido que é internada - e, num regresso, recupera as memórias dolorosas guardadas num baú, com todos os cadernos de registos que fez ao longo dos anos. A decisão parece estar tomada e será desta que irá ultrapassar a doença. A vontade e o esforço, pelo menos, estão nos níveis máximos. Há que queimar o passado obsessivo e libertar-se.

Do desconforto para a libertação, assim nos surge Raposa que, mais do que um pedido de ajuda, alerta para um problema quase invisível, que causa sofrimento sem medida.

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