sábado, 12 de setembro de 2020

MOTELx'20: Melhor Curta de Terror Portuguesa

Na corrida para o Prémio Melhor Curta de Terror Portuguesa / Méliès d'argent do MOTELx 2020 estão 12 curtas-metragens. Há terror para todos os gostos com A Grande Paródia, de André Carvalho; Carnaval Sujo, de José Miguel Moreira; Com Sono, Mas Não Durmo, de Tiago Bastos Nunes; Death on Tape, de Pedro Miguel Costa; O Intruso, de Hugo Pinto; Karaoke Night, de Francisco Lacerda; Loop, de Ricardo M. Leite; Mata, de Fábio Rebelo; Mirror Room, de David Seguro; Petrichor, de Gustavo Silva; Porque Odeias o Teu Irmão?, de Pedro Martins e Inês Marques; e O Silêncio, de Pedro Caldeira e Paulo Graça

O Hoje Vi(vi) um Filme viu as curtas-metragens em competição e deixa-te uma breve análise.

A Grande Paródia, de André Carvalho 
"Um realizador adormece enquanto vê televisão e sonha sobre vender a alma a troco de fama e glória." A Grande Paródia traz-nos um filme a preto e branco, filmado em película de 8mm, onde os sonhos comandam a acção e revelam o quão longe o protagonista pondera ir para alcançar os seus objectivos.

André Carvalho realiza, escreve, produz e é o actor principal neste filme mudo, que joga com ambições recalcadas que os sonhos fazem surgir. O bom trabalho de caracterização e efeitos especiais contribuem para a sensação de horror - e alguns arrepios - com o que vemos no ecrã - e com muito gore à mistura.

Carnaval Sujo, de José Miguel Moreira
"Os namorados Pedro e Inês viajam de Lisboa para assistir ao Carnaval de Ovar. Perdem-se nos pântanos da Ria, onde quase atropelam Teresa, uma criança desaparecida.Teresa foge, e Pedro e Inês procuram-na na laguna, ao mesmo tempo que a protegem de um estranho e perigoso grupo de mascarados que também procura a criança: os Dominós..."

Nem tudo é o que parece, muito menos no Carnaval, será a principal mensagem a reter do filme de José Miguel Moreira, Carnaval Sujo. A curta-metragem mergulha nas tradições do Carnaval de Ovar para criar um ambiente de suspeita constante, sensualidade e descoberta. O título Carnaval Sujo remonta aos anos 50, momento crítico destas festividades, onde os mascarados aproveitavam para cometer crimes.

Com Sono, Mas Não Durmo, de Tiago Bastos Nunes
"Uma viúva que grava os próprios sonhos é incapaz de dormir até que o marido regresse a casa. Uma viagem pela memória daqueles que já partiram e a morte que nem sempre é aceite por aqueles que ficaram." Com Sono, Mas Não Durmo traz-nos uma arrepiante performance de Cucha Carvalheiro, na pele de uma mulher perturbada e que parece não suportar a ideia de que o marido morreu.

Entre a espera infinita, as noites sem dormir, em vigília, a rotina diária que mantém, enlouquecem a protagonista, e Tiago Bastos Nunes sabe como contagiar a plateia com a desorientação, a par do comportamento arrepiante desta viúva.

Death on Tape, de Pedro Miguel Costa
"Frank, um engenhoso guitarrista de metal, determinado em entrar para a história do rock graças a uma inovação capaz de superar o famoso 'live on tape', consegue, para esse fim, atrair Angie, uma sensual bailarina." Death on Tape, de Pedro Miguel Costa, usa a sensualidade e a música para criar um filme de terror.

Da beleza e ingenuidade da protagonista, ao ideal macabro idealizado pelo músico, Death on Tape  é atento ao detalhesabe manter o suspense, alcançando um final pouco previsível.

Karaoke Night, de Francisco Lacerda
"Dois turistas desprezíveis passam a noite num bar de Karaoke, nos Açores, quando dão de caras com uma jovem sedutora a cantar.. Mal sabem eles que a rapariga tem intenções maléficas. Karaoke Night é uma história sobre amizades bizarras e um lembrete para não tomarmos tudo como garantido, a menos que planeie ter a noite da sua vida, literalmente." Karaoke Night marca o regresso do realizador Franscisco Lacerda regressa ao MOTELx, com o dedo de Fernando Alle (Mutant Blast). O humor negro e com muito gore em português não podia faltar à Competição Portuguesa, numa espécie de revenge movie.

Karaoke Night é uma paródia com muito sangue, personagens estereotipadas e seres de outro planeta, tudo acompanhado por uma música de karaoke, num bar dos Açores, em tons néon.

Loop, de Ricardo M. Leite
"O ano é 2113, a humanidade encontra-se no limiar da extinção devido ao avanço tecnológico. Raquel procura encontrar uma solução para o problema recorrendo à inteligência artificial. "Loop", um filme hipnótico que explora uma realidade distópica". E quem disse que Portugal não se pode aventurar na ficção científica? Loop, de Ricardo M. Leite serve de prova que é possível fazê-lo com bastante competência.

Loop demarca-se pelo visual, parte futurista, parte de desolação, num mundo destruído, com a tecnologia e a inteligência artificial a tomar lugar - e um grande foco para a consciência ambiental. Um filme construído entre duas dimensões, com muitos mistérios e um grande trabalho de direcção artística, maquilhagem, guarda-roupa e efeitos especiais e sonoros.

Mata, de Fábio Rebelo
"Um casal perdido na floresta acaba por se encontrar. Mas qual será o preço a pagar por esse reencontro?" Logo desde o título, Mata, de Fábio Rebelo, troca-nos as voltas. Um casal passeia por entre as árvores, mas já não sabe onde está e não tem rede no telemóvel. Estão apenas em contacto um com o outro, até que uma sequência de acontecimentos têm lugar.

O realizador constrói uma narrativa circular e perturbadora, num ambiente isolado e sombrio, propício às histórias de terror. Será melhor estar perdido ou encontrar-se?

Mirror Room, de David Seguro
"Luís é um rapaz que aparenta ser normal, revive constantemente o mesmo sonho interrompido apenas pelo toque ensurdecedor de um telefone antigo. Estes sonhos começam a revelar uma verdade aterrorizante e a consumir aos poucos a vida de Luís." David Seguro apresenta-nos Mirror Room, com uma narrativa onde os sonhos persistentes e repetitivos assombram a existência do jovem protagonista.

Mirror Room joga com o sonho e a realidade, sendo difícil distingui-los, após tantas noites agitadas, tantos desenhos sonâmbulos, tanta tinta preta, tanto sangue. Entre a claustrofobia de um quarto fechado e de pesadelos insistentes, Luís duvida de si e do que acontece em seu redor. Bom trabalho de montagem, ritmado e consistente para o crescendo de tensão da curta-metragem.

O Intruso, de Hugo Pinto
"Uma adaptação moderna do conto The Outsider do escritor americano H.P. Lovecraft. Um misterioso indivíduo que habita sozinho num castelo decide libertar-se em busca de algum contacto humano e de luz." Hugo Pinto cria a sua visão muito própria do conto que adapta, com Cláudia Semedo a dar a cara ao misto de emoções, choque e terror. 

O Intruso é um trabalho muito subjectivo e dinâmico. A protagonista confronta-se consigo própria e com os medos e horrores que a fechavam em si e dentro do castelo, qual fortaleza intransponível. 

O Silêncio, de Pedro Caldeira e Paulo Graça
"O silêncio desenhava as paredes, cobria as mesas, emoldurava os retratos. O silêncio esculpia os volumes, recortava as linhas, aprofundava os espaços. Foi então que se ouviu o grito. A partir do conto Silêncio de Sophia de Mello Breyner". Mais uma adaptação da literatura para o cinema nesta competição de curtas nacionais do MOTELx. Filmado em película de 16mm, a preto e branco, O Silêncio, de Pedro Caldeira e Paulo Graça, convida-nos a entrar no universo psicológico da protagonista.

Um trabalho onde as sombras e os sons ganham especial destaque, bem como os olhares que se cruzam e dizem muito mais do que as palavras. Há segredos, medos e circulo que se fecha.

Petrichor, de Gustavo Silva
"Uma artista pinta as suas inseguranças. Quem ganhará?" A proposta de Gustavo Silva, Petrichor, leva-nos às pinceladas que compõem um quadro, onde várias figuras nos olham sérias e inquisidoras. A pintora cria, mas sente-se ameaçada - ou perseguida - pela sua criação, mas esta persiste, mais não seja acompanhando-a no pedaço de tinta marcado no seu rosto.

A obra de arte ganha uma dimensão mística - um reflexo dos nossos medos - no filme de Gustavo Silva. Um trabalho simples, mas inspirado, com um plano final de arrepiar.

Porque Odeias o Teu Irmão?, de Pedro Martins e Inês Marques
"Clara e Vítor são dois irmãos com uma  relação conturbada, marcada pelo desacordo sobre o rumo a tomar em relação à relíquia da família. A relação será ainda mais  abalada pelo súbito aparecimento de um visitante inesperado chamado Luís." Porque Odeias o Teu Irmão? é um trabalho cheio de substância e detalhes, com leituras históricas que irão além da visualização.

Carla Chambel incorpora uma mulher que vê a sua vida anulada para cuidar da mãe (Carmen Santos) doente e o seu olhar espelha a loucura que dela se tem apoderado. A decoração da casa onde habitam causa arrepios e carrega as memórias de uma família que viveu em Moçambique - uma herança causadora de desavenças familiares. Mas a chegada de um homem (Welket Bungué, revelando grande química no ecrã com Carla Chambel) faz com que o passado de duas famílias se cruzem. Os objectos contam-nos a história que Pedro Martins e Inês Marques tão bem constroem no ecrã. Porque Odeias o Teu Irmão? faz reflectir sobre a herança colonial, com uma história de terror e suspense crescente a lançar subtilmente o debate.

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