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domingo, 3 de janeiro de 2021

Crítica: Ordem Moral (2020)

*7.5/10*

Ordem Moral, de Mário Barroso, é um elogio a uma mulher que desafiou o seu tempo. Um exemplo de emancipação e feminismo numa época de turbulência social e política - e mesmo de saúde pública, com a gripe espanhola a fazer vítimas, numa imprevisível analogia aos dias que vivemos.

"A história que pretendemos contar é pública e conhecida: em 1918, Maria Adelaide Coelho da Cunha, herdeira e proprietária do Diário de Notícias, abandona o luxo social, cultural e familiar em que vive para fugir com um insignificante chauffeur, 26 anos mais novo. As consequências desta sua decisão serão obviamente dolorosas e moralmente devastadoras."

O retrato de uma época em que as mulheres eram meros acessórios: as de classe baixa viviam para o trabalho e abusos dos patrões, sem dignidade ou defesa, as da alta sociedade vivam no ócio, inúteis e esquecidas pelos homens da casa, que as desrespeitavam e se desfaziam delas quando assim lhes conviesse. Não seria assim tão linear, mas o resumo está feito e somavam-se exemplos, como bem nos conta Ordem Moral, pegando na história da herdeira do Diário de Notícias, interpretada de corpo e alma por Maria de Medeiros. Uma interpretação magistral que é a alma da longa-metragem, entre a rebeldia, o altruísmo, a simplicidade, a paixão, o desespero, mas sem baixar os braços, até ao fim.

Para todos os médicos famosos da época, Maria Adelaide era louca por querer viver e amar, com justificações pouco científicas, em que a menopausa seria a desculpa ideal para aprisioná-la num manicómio e privá-la, ainda mais, de gerir os seus bens. Um marido bem relacionado só piorava a situação de uma mulher que já tinha parcos direitos perante a Lei.

Há um excelente trabalho na recriação da época no guarda-roupa e direcção artística, cuja direcção de fotografia de Barroso compõe e ilumina em belíssimos quadros. Ao mesmo tempo, é capaz de tocar temas como a homossexualidade, o aborto clandestino, a situação política instável e a ascensão dos nacionalismos, os horrores da pneumónica, tudo sem desviar a atenção da figura e mensagem principais.

De foragida por amor - e desejo de liberdade - a prisioneira num hospital - onde encontrou algumas injustiçadas como ela -, Maria Adelaide foi um marco no feminismo e na emancipação das mulheres na sociedade, desafiando convenções, os homens e toda a qualquer Ordem Moral.

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