segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

Crítica: A Noite Passada em Soho / Last Night in Soho (2021)

"Do you believe in ghosts?"

Eloise


*8/10*

A criatividade sem limites de Edgar Wright junta-se ao leque de influências do realizador e resulta num inspirador giallo moderno chamado A Noite Passada em Soho. Um filme que explora duas eras distintas como se fossem a mesma, com personagens dúbias e muito suspense.

A Noite Passada em Soho acompanha Ellie (Thomasin McKenzie), uma jovem estudante, apaixonada por design de moda, que misteriosa e inesperadamente consegue entrar na década de 1960 onde encontra a sua musa, Sandie (Anya Taylor-Joy) uma jovem "aspirante a cantora. Mas Londres dos anos 60 não é o que parece, e o tempo parece desmoronar-se à sua frente com consequências sombrias…".

Desde logo somos confrontados com algo de sobrenatural associado à protagonista, que alimenta uma ligação especial com a falecida mãe. Os espelhos são a revelação da mente perturbada de Ellie, que se degrada com o avançar da narrativa, e o terror psicológico instala-se. Os seus dons - artístico e metafísico - unem-se numa experiência que percorre duas eras e duas vidas distintas, e apresentam-lhe novos rostos, do presente e do passado.

Edgar Wright cria um universo repleto de influências e homenagens: o giallo, Dario Argento, Repulsa, de Polanski, ou os filmes de James Bond são algumas presenças que se destacam na história e suas personagens.

A Noite Passada em Soho leva-nos numa viagem audaciosa, onde abundam beleza, moda, música, sonhos e alucinações. A direcção de fotografia tem um papel preponderante em toda a acção, quer pelos jogos de espelhos, as luzes neon, as sombras, os desfoques e o destaque das cores intensas e vibrantes - em especial nas cenas dos anos 60.

Ainda a direcção artística cuidada é exímia na fusão entre passado e presente: o gira-discos e os discos de vinil, o telefone retro, toda a decoração do quarto da protagonista em casa da avó, as suas roupas ou a jukebox no bar onde trabalha, por exemplo.

Thomasin McKenzie, como Ellie, e Anya Taylor-Joy, como Sandie, conquistam o ecrã com duas personagens tão distintas e que se inspiram mutuamente. A obsessão que a protagonista nutre pela figura da jovem dos anos 60 é fundamental para a decadência de Ellie. Thomasin McKenzie encara a fragilidade e inocência da jovem solitária que acabou de chegar à grande cidade, com a mesma força que desenvolve a curiosidade e a coragem da personagem, em cada incursão nocturna aos anos 60. Já a elegância e o mistério que Anya Taylor-Joy coloca em Sandie justificam todo o encanto que cria em quem a conhece, sejam quais forem as intenções para com ela. Uma mulher segura, sensual e confiante, que Ellie vê como inspiração e quer, por tudo, proteger.

E nesta história que cruza décadas, sempre ao som da melhor música dos anos 60, Edgar Wright traça uma arriscada jornada para as suas personagens, num ambiente tão hipnótico como perigoso, tão belo como violento. 

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