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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Crítica: Belfast (2021)

"...if they cant understand you, then they're not listening. And that's their problem."

Pop


*7/10*

Belfast traz os conflitos de 1969, na Irlanda do Norte, através dos olhos de uma criança. Kenneth Branagh inspira-se na sua própria experiência para criar um universo de sonhos e medo, aventura e incerteza, na agitada vida de Buddy, um menino de nove anos, e de todos os que o rodeiam.

Da Belfast actual, moderna e a cores, viaja-se no tempo para o final da década de 60 do século passado, onde Branagh opta por filmar a preto e branco. 

No Verão de 1969, Buddy vive na parte norte de Belfast, brinca na rua com os amigos e tem a família alargada por perto - primos, tios e avós reúnem-se com frequência. Mas com o escalar dos confrontos nas ruas, que opõem católicos a protestantes, a cidade torna-se perigosa. A mãe luta para lidar com a situação e o pai trabalha em Inglaterra, tentando ganhar dinheiro suficiente para sustentar a família e fazer face às dívidas. Buddy vê o seu mundo virado do avesso e tenta dar sentido às lutas e ódios que o rodeiam.

Belfast recupera as memórias dos que viveram estes tempos difíceis na cidade, e sente-se a proximidade do realizador para com a história que conta, dedicada aos que partiram e aos que ficaram. Através da inocência do protagonista, Branagh explora a incompreensão das crianças - e de muitos adultos - acerca de um conflito adensado por diferenças religiosas; a escalada de violência e ameaças; a impossibilidade de ser-se neutro num bairro que sempre viveu em comunhão; tudo enquanto Buddy vive a experiência do seu primeiro amor.

E enquanto os confrontos escalam e a insegurança aumenta, a par da pobreza e do desemprego, Buddy refugia-se na sala de cinema ou na televisão da sala de estar, com a família, perdendo-se em sonhos que só os filmes e as séries conseguem criar; em conversas profundas com o avô e a avó; ou em perigosas aventuras pelas ruas, com a prima.

O lado biográfico e íntimo que Belfast tem para Kenneth Branagh acaba por ser a sua maior fraqueza. Dirá muito a quem viveu o que o filme retrata, mas não conquistará da mesma forma quem desconhece esta realidade. Compensa, contudo, com o entusiasmo do actor principal, Jude Hill, a grande força motora da longa-metragem, e com as interpretações de Ciarán Hinds, tão discreto como fulcral para o realismo das relações, e, ao seu lado, Judi Dench, a avó atenta e de conselho pronto a dar.

Outra das maiores forças de Belfast está na direcção de fotografia de Haris Zambarloukos, e nos planos de grande intensidade dramática (em que Buddy é o guia), onde o preto e branco se destaca e, em conjunto com a direcção artística, potencia o ambiente da época. A cor surge apenas no tempo presente e nas artes que fazem o protagonista sonhar.

Sente-se o afecto que Branagh coloca no seu filme e esse sentimento confere um encanto especial a Belfast que, contudo, peca por ser tão pessoal. Essencialmente, através de memórias de infância, cria-se uma bonita e competente obra de homenagem a uma época e aos seus lutadores.

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