domingo, 27 de março de 2022

Crítica: CODA / No Ritmo do Coração (2021)

"Can you sing it for me?"

Frank Rossi

*7/10*

Com CODA, a realizadora Sian Heder convida a entrar num mundo quase desconhecido para a maioria das pessoas: como é ser surdo na sociedade actual e, mais concretamente, como é ser o único ouvinte numa família de surdos. CODA é um remake norte-americano do filme francês A Família Bélier, de 2014, todavia, no filme de 2021, os três actores que interpretam personagens surdas são surdos na vida real.

"A jovem Ruby, filha de pais surdos, vive numa comunidade pesqueira de Massachusetts, dividida entre ser a intérprete dos pais com o mundo exterior e perseguir o sonho de uma carreira como cantora."


CODA (sigla para Child of Deaf Adults - filhos ouvintes de pais surdos) explora, com algum humor mas também grande realismo, a vida de uma adolescente e da sua família surda. Se, por um lado, os pais e irmão dependem de si para ser compreendida por quem os rodeia (principalmente no seu negócio na pesca), por outro, Ruby sente-se muitas vezes à parte da família, com quem não pode partilhar a sua maior paixão, a música.

O argumento roda em torno dos dilemas da adolescente, mas igualmente da família, em especial do pai e irmão, os que melhor compreendem que o futuro de Ruby pode não passar pela vida que eles levam. A par disso, junta-se a vida escolar da protagonista, o bullying que sofre por pertencer a uma família de surdos, o primeiro amor e o seu empenho nas aulas de canto de que poderá depender a sua entrada na universidade.

CODA é uma obra simples e melodramática, que propõe uma reflexão séria sobre as dificuldades que a população surda enfrenta no que toca à integração, justiça e independência; mas igualmente põe em cheque o comportamento da sociedade, que não faz o suficiente para acolhê-la.

Há que destacar o trabalho de sonoplastia, capaz de colocar a plateia dos dois lados, com algumas sequências em que não se ouve qualquer som. Para além disso, o fundamental para CODA funcionar tão bem é o trabalho dos actores, em especial a protagonista Emilia Jones que aprendeu linguagem gestual americana, como manobrar uma traineira de pesca e teve aulas de canto. A jovem actriz entrega-se à personagem e mostra-se à altura do desafio. Ao seu lado, está Troy Kotsur, como Frank, o pai compreensivo e capaz de tocar verdadeiramente o coração da plateia. Ele é sensibilidade e realismo em carne e osso. O actor surdo tem uma interpretação comovente e é capaz de transmitir tanto sem falar: entre a frustração de não ser compreendido pelos que ouvem, as dificuldades financeiras e o dilema em torno do futuro da filha mais nova. Também Daniel Durant merece destaque, ele é o irmão mais velho de Ruby, que luta pela própria independência, seguro de que será capaz de ter uma vida normal, mesmo sem ouvir.

Sian Heder pega na premissa do filme francês e abre portas para que o mundo conheça a realidade e dificuldades das famílias surdas. O elenco de CODA é a prova viva de que basta uma oportunidade para mostrar o valor que cada um tem em si e alcançar a merecida notoriedade e reconhecimento.

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