terça-feira, 12 de julho de 2022

Curtas Vila do Conde 2022: Fogo-Fátuo (2022)

"Um príncipe... bombeiro?"

Comandante

*8/10*

Fogo-Fátuo estreou em Cannes e tem seguido o seu percurso por vários festivais de cinema, chegando agora a Vila do Conde. Na secção Da Curta à Longa, João Pedro Rodrigues marca presença com a sua primeira comédia. Um musical futurista, queer e vibrante, que filma a beleza e a conjugação dos corpos, na arte, na História e na Natureza.

"2069, ano talvez erótico - logo veremos - mas fatídico para um rei sem coroa. No seu leito de morte, uma canção antiga fá-lo rememorar árvores; um pinhal ardido e o tempo em que o desejo de ser bombeiro para libertar Portugal do flagelo dos incêndios, foi também o despontar de outro desejo. Então príncipe, Alfredo encontra Afonso. Com diferentes origens e diferentes cores de pele, encontram-se, socorrem-se e o léxico do abuso fica farrusco de desejo. Mas a exposição pública e as suas expectativas interpõem-se e Alfredo abraça um outro estado de prontidão para uma realidade improvável."

Provocador, sarcástico e eficaz, Fogo-Fátuo mantém e vai além dos temas que têm marcado a filmografia de João Pedro Rodrigues. O passado esclavagista português é indissociável da narrativa principal, mas igualmente a sexualidade, a política, os incêndios e o racismo.

O filme passa-se em três tempos distintos: 2011, entre 2017 e a actualidade, e 2069 e, partindo do futuro, viaja-se ao passado para contar a história deste príncipe que não o é.

A ironia de João Pedro Rodrigues não se sente apenas nas palavras dos actores, mas também nos planos de câmara instigantes; na recriação homoerótica de pinturas famosas, ou na forma como o olhar de algumas personagens se dirige à plateia - e com ela também interage.

O elenco chega repleto de surpresas, vindas de várias áreas artísticas - e não só. Destaque para a dupla protagonista Mauro Costa e André Cabral, e à química que transpiram no ecrã, essencial para Fogo-Fátuo funcionar tão bem: do ar angelical do primeiro à sensualidade do segundo, eis a combinação perfeita para encabeçar o filme.

O lado musical de Fogo-Fátuo fica no ouvido, acompanhado por coreografias que vagueiam entre a dança e a pintura. O erotismo e a sensualidade são uma constante, potenciados pela câmara de João Pedro Rodrigues. Enquanto algumas imagens simulam quadros, as restantes são telas em movimento do director de fotografia Rui Poças.

Assente essencialmente na estética, no culto dos corpos, Fogo-Fátuo irá sempre despoletar sentimentos - sejam eles quais forem - na plateia, e ficará na cabeça - temas, imagens e canções - durante muito tempo.

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